O ministro da Educação do governo Michel Temer, José Mendonça Filho (DEM-PE), afirmou anteontem no seu perfil no Facebook que irá acionar a Justiça para impedir a realização do curso "Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil".
A disciplina é organizada pelo professor Luís Felipe Miguel (foto acima), da Universidade de Brasília, também responsável pelo ensino.
Miguel tem 51 anos e era um bebê quando a mesma instituição foi atingida por outra ação golpista.
Tropas da ditadura militar, em 29 de agosto de 1968, invadiram a universidade, reprimindo e prendendo professores que lutavam contra o regime militar.
Era o auge dos movimentos estudantis, iniciados em 1966 depois que o ministro da Educação e acadêmico paranaense Flávio Suplicy de Lacerda, ainda no governo Castelo Branco, divulgou um programa privatizante e tecnocrático de Educação.
Esse programa era feito em parceria com a até hoje existente Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). Daí o nome "acordo MEC-USAID", muito famoso na época.
A Universidade de Brasília surgiu com um histórico progressista.
Uma grande geração de professores e intelectuais progressistas, como Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira, criou um revolucionário projeto pedagógico. Até Oscar Niemeyer ganhou disciplina como professor da UnB.
Mas a trajetória progressista durou pouco. Em 1964, veio o golpe militar que lançou a ditadura que arrasou o país.
PROFESSORES TENTAM RESISTIR AO ARBÍTRIO DITATORIAL NA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA, EM 1968.
E aí voltamos a José Mendonça Filho, que tentou dar uma "visão objetiva" à sua intenção de censurar a UnB e seu professor Luís Felipe Miguel. Mentiu ao dizer que defende a autonomia universitária que quer combater com a censura ao curso.
"Eu respeito a autonomia universitária e reconheço a importância da UnB, mas não se pode ensinar qualquer coisa. Se cada um construir uma tese e criar uma disciplina, as universidades vão virar uma bagunça geral", diz Mendonça Filho.
Ele alegou que a disciplina "carece de base científica" e aborda o impeachment de Dilma Rousseff "sob o ponto de vista petista".
"Não é uma questão de opinião, nem de reverberar a tese petista sobre o impeachment de Dilma Rousseff. Eu, por exemplo, tenho autonomia para dirigir o MEC, mas não posso transformar a pasta em instrumento de apoio ao meu partido ou a qualquer outro partido", alegou o ministro.
Só que Mendonça Filho havia acolhido, dois anos atrás, o projeto reacionário da Escola Sem Partido, na verdade partidarizado à direita e recheado de fantasias religiosas.
Ele mesmo não é um especialista em Educação, portanto não pode falar em base científica para esta ou aquela disciplina universitária, se ele também não tem base científica para fazer as suas decisões no Ministério da Educação.
Mendonça Filho alegou que o governo do qual ele faz parte "não é golpista".
A própria ditadura militar, em seu tempo, passou quatro anos recusando-se a definir como ditadura: se autoproclamava "revolução democrática" ou "governo revolucionário".
Durante anos, fomos obrigados a aprender que o golpe de 1964 era "Revolução de 1964".
Com a disciplina de Luís Felipe Miguel, evitaríamos que nossos jovens aprendessem que o golpismo político de 2016 era a "recuperação democrática do país marcado pela corrupção".
O curso Golpe de 2016 integrará a grade do Instituto de Ciência Política (IPOL) da UnB.
A disciplina está ainda aberta a modificações, mas Miguel pretende ensinar aspectos do golpismo político, como as investigações tendenciosas do Judiciário e a retomada do poder pelas forças conservadoras.
Os movimentos sociais e as forças progressistas manifestaram total repúdio à posição de Mendonça Filho, que ameaça banir o curso.
Nós também repudiamos a censura à UnB e à pessoa do professor Luís Felipe Miguel.
E isso num período maluco em que o impopular Michel Temer é "ventilado" como possível candidato à sua sucessão.
Brasil absurdo, este em que vivemos.
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