A apuração do Carnaval 2018 de hoje foi diferente da de antes.
Não se tratava de um mero rodízio de medalhões dos desfiles, como as grandes escolas de samba mais conhecidas.
Trata-se de um "duelo" entre a favorita da Rede Globo, a Beija-Flor de Nilópolis, e a Paraíso do Tuiuti, a mais popular.
Evidentemente, a plutocracia vibrou com a vitória da escola de samba da Baixada Fluminense.
Mas a Tuiuti teve, no vice-campeonato, um sabor extra de vitória.
Em 2017, a escola de São Cristóvão, bairro carioca, teve um carro alegórico acidentado, matando uma pessoa, a jornalista e radialista Elizabeth Ferreira Jofre, a Liza Carioca, e ferindo 19.
E, em tempos temerosos, lançou um samba-enredo de risco, com o desfile criado pelo carnavalesco Jack Vasconcelos.
O tema era a escravidão, com o título "Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?".
Por ironia, um dos autores do enredo, o sambista Moacyr Luz, foi assaltado quando se dirigia à Marquês de Sapucaí. O aumento dos assaltos é sintoma dos tempos temerosos.
A própria reforma trabalhista, por promover o desemprego e a degradação do mercado de trabalho, faz muitos pobres retornarem ao crime.
O desfile foi mais empolgante do que o desfile "coxinha" da Beija-Flor.
O da Beija-Flor foi meio baixo astral. O tema era a "corrupção", sob o ponto de vista dos espectadores padrão da Rede Globo.
Tinha simulações de sequestro e policiais feridos e evocava aquela "indignação" que fez os "coxinhas" e "paneleiros" protestarem contra Dilma Rousseff.
No caso da Tuiuti, se ela seguisse uma fórmula convencional, citaria a escravidão apenas até o século XX e se limitaria a mostrar a escravidão no campo, no interior do país.
Mas não. Resolveu ousar e mostrou pessoas fantasiadas com Carteira de Trabalho, presidente-vampiro, patos de borracha com olhos de cifrão e "manifestoches" vestidos de camisa da CBF e batendo panelas.
A Beija-Flor teve uma vitória rotineira, que pode não ter soado uma derrota existencial, mas era uma vitória sem empolgação, formal e burocrática.
Mas houve também derrotas nesse Carnaval.
A Mocidade Independente de Padre Miguel, outra protegida das Organizações Globo, nem chegou às três escolas campeãs, amargando um modesto sexto lugar que, por pouco, ainda lhe permite participar do desfile das campeãs.
Ela recebeu do jornal O Globo, no seu concurso Estandarte de Ouro, o prêmio por melhor samba-enredo.
Dedicado à Índia, o enredo peca por citar dois ídolos religiosos ultraconservadores, por sinal blindados pela Rede Globo. São uma tal de Teresa e um tal de Francisco.
Uma beata acusada de maltratar pobres e doentes mas virou santa e um paranormal brasileiro cuja trajetória foi marcada por grave coleção de confusões e irregularidades. Ambos já falecidos.
Ambos os religiosos, oficialmente "símbolos máximos de caridade e amor ao próximo" (leia-se "padrão Luciano Huck de caridade"), faziam apologia ao sofrimento humano, dizendo aos sofredores para "suportarem tudo calados".
Esse ideal medonho faz parte da horripilante Teologia do Sofrimento, uma ideologia católica tirada de calabouços fétidos e embolorados da Idade Média. E muitos acreditam que esses "iluminados" são progressistas, dá para entender?
Os dois "filantropos" não conseguiram levantar a escola, citados na letra de música. Foi um sexto lugar com sabor de derrota, apesar da vaga garantida para o Desfile das Campeãs.
Em Salvador, outra "vitória" com sabor de derrota foi a do cantor Léo Santana, ícone do "pagodão" baiano.
Léo queria ser a "Paraíso do Tuiuti" da vez, mas o refrão "Vai dar PT" acabou se tornando um "hino petista" com sabor de Movimento Brasil Livre.
O MBL (aliás Movimento Me Livre do Brasil) adoraria cantar "Vai dar PT, vai dar / Vai dar PT, vai dar" às gargalhadas, torcendo para o Partido dos Trabalhadores ter "perda total" nas eleições de 2018.
Léo Santana, no seu trio elétrico, até tentou cumprimentar o governador baiano, do PT, Rui Costa. Deve estar visando umas verbas públicas, como todo brega-popularesco que corteja as esquerdas visando uma graninha da Lei Rouanet.
Mas enquanto Léo Santana e a Mocidade Independente de Padre Miguel (puxa, quase saiu Padre Michel!) festejam suas "vitórias de Pirro", a Tuiuti se torna a maior vencedora.
Se não conseguiu o primeiro lugar, a Tuiuti pelo menos alcançou uma colocação alta merecida pelo seu trabalho.
E mostrou o golpe político para quem desconhecia desse triste cenário, acostumado a ver mil maravilhas narradas pelos telejornais da mídia venal.
Foi uma grata surpresa. E, o que é melhor: o Paraíso do Tuiuti fez um desfile divertido, didático, bonito de se ver e bastante conciso nas suas críticas ao golpismo político.
Portanto, a forma como foram feitas as críticas sociais da Paraíso do Tuiuti também fez a escola brilhar, reforçando a intenção contestatória com um belo espetáculo.
É certo que não sabemos o que virá depois, mas com o vice-campeonato da Tuiuti, dá para respirar aliviado. Pelo menos alguém reage contra os arbítrios políticos de hoje, e é uma multidão que usou uma escola de samba como canal para protestar.
Se a plutocracia continuar no poder e eleger seu representante em 2018, pelo menos o desfile da Paraíso da Tuiuti foi um grande aviso do povo aos tempos que hoje vivemos.
O que importa é que a mensagem carnavalesca foi dada, um recado que desnorteou a Globo e fez os "coxinhas" que militaram pelo "Fora Dilma", há dois anos, sentirem vergonha de si mesmos.
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