Pular para o conteúdo principal

COMO OS MOVIMENTOS SOCIAIS VÃO MANTER LULA À ESQUERDA?

 MOVIMENTO LULA LIVRE - Protestos ou festas populares?

O historiador Fernando Horta, uma das vozes do obsessivo desejo de ver Lula sendo eleito presidente do Brasil na marra, foi também um dos que ridicularizaram o alerta da influenciadora drag Rita Von Hunty.

Para quem não sabe, Rita Von Hunty desaconselhou o voto em Lula porque o petista se aliou com forças relacionadas com o golpe político de 2016.

Irritado, Horta definiu a postura de Von Hunty de "infantilidade revolucionária", classificando a personagem como exemplo de "marxistas de Internet" que, segundo o historiador, "não entendem de marxismo".

Horta defende que Lula seja a única opção de voto, corroborando com os demais esquerdistas que veem na sucessão presidencial um jogo de polarização entre o lulismo e o bolsonarismo.

Mas dentro de uma corrente preocupada com as raízes esquerdistas de Lula, das quais incluem o cientista político Aldo Fornazieri, o também historiador Valter Pomar e o jornalista Breno Altman, Horta propõe que os movimentos populares vão para as ruas em defesa do petista.

Em outras palavras, todos os citados defendem que as classes populares se mobilizem para pressionar Lula, na hipótese dele governar o Brasil, a manter pautas progressistas em seu programa de governo.

Isso envolve, entre outras coisas, passeatas de sindicatos de trabalhadores pedindo melhores salários e garantias trabalhistas e camponeses lutando por essas pautas e também pelo fim da violência e da impunidade coronelista no campo.

Seria protestar contra os interesses dos aliados pontuais de Lula, como m empresariado e o agronegócio, além de políticos associados, como Geraldo Alckmin, José Sarney e Geddel Vieira Lima.

Mas esse não é só o problema. O problema está na natureza das manifestações.

A julgar pela má vontade dos movimentos "Fora Temer" e "Fora Bolsonaro", com manifestações meramente pontuais, sem perseverança e com clima mais de festa do que de protestos populares, a coisa será ainda mais problemática.

Além disso, boa parte desses movimentos são comandados por uma classe média muito bem de vida, que confunde protestos populares com procissão de devoção ao messiânico de plantão, no caso o próprio Lula.

Uma esquerda mainstream, parte integrante de uma "parcela boa" da elite do atraso - a princípio empenhada em expulsar a "parte podre" do bolsonarismo - , acredita no maniqueísmo constrangedor, de que a esquerda é sinônimo de "alegria" e "amor" e a direita, sinônimo de "raiva" e "ódio".

E isso é patético, porque falta nas esquerdas de hoje uma indignação de verdade.

Nos últimos vinte anos, as esquerdas médias, com base nesse maniqueísmo, acolheram valores da direita cultural - no âmbito da música, do comportamento, do esporte, da religião - como se fossem próprios do esquerdismo. São os que eu chamo de "brinquedos culturais" da direita civilizada.

Nesse prisma, qualquer reacionário que falar macio e não adotar tons hidrófobos ou abertamente discriminatórios será acolhido pelas esquerdas, por mais que fosse um sujeito extrema e até doentiamente conservador.

Pode até mesmo ter defendido ou participado da ditadura militar ou mesmo ser machista ou racista, que, desde que adote um tom positivista no discurso prometa coisas como fazer pobre sorrir e promover o desenvolvimento econômico e social ou a paz entre os povos, que o cara vira "esquerdista" na hora.

Palavras mágicas como "interatividade", "mobilidade urbana", "espiritualismo" e "solidariedade" também fazem do direitista histérico um "esquerdista desde criancinha".

Sim, isso mesmo, direitistas assim não passam a serem vistos como "esquerdistas por adoção", algo equiparado a um estrangeiro naturalizado, mas como se fosse um "esquerdista nato", como se, com todo o direitismo, o forasteiro tivesse sempre sido alguém de esquerda.

E é isso que fez com que fosse fácil um Geraldo Alckmin, que em 2018 tinha uma postura antipetista com visão lavajatista, fosse adotado nos últimos meses como o mais novo "esquerdista desde criancinha" da temporada.

E isso causa problemas nos movimentos de apoio a Lula, como levar às divergências internas.

Há uns que querem uma maior moderação de Lula, outros que querem uma volta às raízes, se não de forma radical, mas pelo menos próxima do passado sindical do petista.

E é nesta tendência quase radical que se inclui o historiador Fernando Horta e seus pares acima citados.

Fernando Horta fala que os alertas de Rita Von Hunty são expressão de "infantilidade revolucionária".

O que ele quis dizer com isso?

Na visão do historiador, trata-se de uma suposta ingenuidade de marxistas que agem de maneira inflexível, presos a uma perspectiva ideológica militante e antiquada.

Mas vamos questionar a tese de Fernando Horta.

Não seria ele, sim, um defensor de uma "infantilidade revolucionária" ao pedir manifestações em favor do programa esquerdista de Lula, ignorando dois problemas muito importantes?

Um problema é que, mesmo com alianças com a direita moderada, Lula trará uma conformação popular diante do costume dos brasileiros de se acomodarem diante de promessas de garantias democráticas.

Ou seja, é um vício comum e contraditório os brasileiros, em maioria, ao verem que existe democracia, vão para a cama dormirem.

Outro problema é que manifestações se pode esperar, já que a maioria das manifestações populares se exerce em clima de festa e quase de procissão religiosa, que na prática mais louvariam o presidente Lula em vez de reivindicar pautas trabalhistas com o necessário empenho.

E isso quando há manifestações, porque, levando em conta o que fez o Movimento Fora Bolsonaro, o pessoal preferia ficar no "ativismo de sofá" da memecracia, em vez de ir constantemente às ruas para fazer pressão e protesto políticos de verdade.

Não seria uma infantilidade revolucionária acreditar que uma classe média acomodada e uns pobres remediados ocupados em rebolar o "funk", o tecnobrega e a pisadinha, irão zelar pelas origens progressistas de Lula?

Diante da promessa de um governo "democrático" através do discurso moderado de Lula frente às elites, essas pessoas se acomodarão e a tendência será, com certeza, a de acomodação e conformismo.

Dessa maneira, o governo Lula pode adotar pautas neoliberais que o povo em geral ficará tranquilo, e as classes trabalhadoras ficarão à margem, esperando em vão que as fatias do bolo crescido no seio do empresariado sejam repartidas para o proletariado. Isto é, se forem mesmo repartidas com justiça.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

FUNQUEIROS, POBRES?

As notícias recentes mostram o quanto vale o ditado "Quem nunca comeu doce, quando come se lambuza". Dois funqueiros, MC Daniel e MC Ryan, viraram notícias por conta de seus patrimônios de riqueza, contrariando a imagem de pobreza associada ao gênero brega-popularesco, tão alardeada pela intelectualidade "bacana". Mc Daniel recuperou um carrão Land Rover avaliado em nada menos que R$ 700 mil. É o terceiro assalto que o intérprete, conhecido como o Falcão do Funk, sofreu. O último assalto foi na Zona Sul do Rio de Janeiro. Antes de recuperar o carro, a recompensa prometida pelo funqueiro foi oferecida. Já em Mogi das Cruzes, interior de São Paulo, outro funqueiro, MC Ryan, teve seu condomínio de luxo observado por uma quadrilha de ladrões que queriam assaltar o famoso. Com isso, Ryan decidiu contratar seguranças armados para escoltá-lo. Não bastasse o fato de, na prática, o DJ Marlboro e o Rômulo Costa - que armou a festa "quinta coluna" que anestesiou e en

FIQUEMOS ESPERTOS!!!!

PESSOAS RICAS FANTASIADAS DE "GENTE SIMPLES". O momento atual é de muita cautela. Passamos pelo confuso cenário das "jornadas de junho", pela farsa punitivista da Operação Lava Jato, pelo golpe contra Dilma Rousseff, pelos retrocessos de Temer, pelo fascismo circense de Bolsonaro. Não vai ser agora que iremos atingir o paraíso com Lula nem iremos atingir o Primeiro Mundo em breve. Vamos combinar que o tempo atual nem é tão humanitário assim. Quem obteve o protagonismo é uma elite fantasiada de gente simples, mas é descendente das velhas elites da Casa Grande, dos velhos bandeirantes, dos velhos senhores de engenhos e das velhas oligarquias latifundiárias e empresariais. Só porque os tataranetos dos velhos exterminadores de índios e exploradores do trabalho escravo aceitam tomar pinga em birosca da Zona Norte não significa que nossas elites se despiram do seu elitismo e passaram a ser "povo" se misturando à multidão. Tudo isso é uma camuflagem para esconder

DEMOCRACIA OU LULOCRACIA?

  TUDO É FESTA - ANIMAÇÃO DE LULA ESTÁ EM DESACORDO COM A SOBRIEDADE COM QUE SE DEVE TER NA VERDADEIRA RECONSTRUÇÃO DO BRASIL. AQUI, O PRESIDENTE DURANTE EVENTO DA VOLKSWAGEN DO BRASIL. O que poucos conseguem entender é que, para reconstruir o Brasil, não há clima de festa. Mesmo quando, na Blumenau devastada pela trágica enchente de 1983, se realizou a primeira Oktoberfest, a festa era um meio de atrair recursos para a reconstrução da cidade catarinense. Imagine uma cirurgia cujo paciente é um doente em estado terminal. A equipe de cirurgiões não iria fazer clima de festa, ainda mais antes de realizar a operação. Mas o que se vê no Brasil é uma situação muito bizarra, que não dá para ser entendida na forma fácil e simplória das narrativas dominantes nas redes sociais. Tudo é festa neste lulismo espetaculoso que vemos. Durante evento ocorrido ontem, na sede da Volkswagen do Brasil, em São Bernardo do Campo, Lula, já longe do antigo líder sindical de outros tempos, mais parecia um showm

FOMOS TAPEADOS!!!!

Durante cerca de duas décadas, fomos bombardeados pelo discurso do tal "combate ao preconceito", cujo repertório intelectual já foi separado no volume Essa Elite Sem Preconceitos (Mas Muito Preconceituosa)... , para o pessoal conhecer pagando menos pelo livro. Essa retórica chorosa, que alternava entre o vitimismo e a arrogância de uma elite de intelectuais "bacanas", criou uma narrativa em que os fenômenos popularescos, em boa parte montados pela ditadura militar, eram a "verdadeira cultura popular". Vieram declarações de profunda falsidade, mas com um apelo de convencimento perigosamente eficaz: termos como "MPB com P maiúsculo", "cultura das periferias", "expressão cultural do povo pobre", "expressão da dor e dos desejos da população pobre", "a cultura popular sem corantes ou aromatizantes" vieram para convencer a opinião pública de que o caminho da cultura popular era através da bregalização, partindo d

VIRALATISMO MUSICAL BRASILEIRO

  "DIZ QUE É VERDADE, QUE TEM SAUDADE .." O viralatismo cultural brasileiro não se limita ao bolsonarismo e ao lavajatismo. As guerras culturais não se limitam às propagandas ditatoriais ou de movimentos fascistas. Pensar o viralatismo cultural, ou culturalismo vira-lata, dessa maneira é ver a realidade de maneira limitada, simplista e com antolhos. O que não foi a campanha do suposto "combate ao preconceito", da "santíssima trindade" pró-brega Paulo César de Araújo, Pedro Alexandre Sanches e Hermano Vianna senão a guerra cultural contra a emancipação real do povo pobre? Sanches, o homem da Folha de São Paulo, invadindo a imprensa de esquerda para dizer que a pobreza é "linda" e que a precarização cultural é o máximo". Viralatismo cultural não é só Bolsonaro, Moro, Trump. É"médium de peruca", é Michael Sullivan, é o É O Tchan, é achar que "Evidências" com Chitãozinho e Xororó é um clássico, é subcelebridade se pavoneando

ESQUERDAS CORTEJANDO UMA CANTORA IDENTITARISTA... MAS CAPITALISTA

CARTAZ DA BOITEMPO JUNTANDO KARL MARX E MADONNA NO MESMO BALAIO. O Brasil está tendo uma aula gratuita do que é peleguismo, com Lula fazendo duplo jogo político enganando o povo pobre e se aliando com os ricos, e do que é pequena burguesia, com uma elite de classe média abastada que aoosta num esquerdismo infantilizado, identitarista e indiferente aos verdadeiros problemas das classes trabalhadoras. As esquerdas mainstream do Brasil, as esquerdas médias, são a tradução local da pequena burguesia falada pela teoria marxista. Uma esquerda que quer soar pop e que, através dos “brinquedos culturais” que fazem do Brasil a versão vida real da novela das 21 horas da Rede Globo, quer o mundo da direita moderada convertido num pretenso patrimônio esquerdista. Isso faz as esquerdas soarem patéticas em muitos momentos. Como se observa tanto na complacência do jornalista Julinho Bittencourt, da Revista Fórum, com o fato da apresentação de Madonna em Copacabana, no Rio de Janeiro, não ter músicos e

ALEGRIA TÓXICA DO É O TCHAN É CONSTRANGEDORA

O saudoso Arnaldo Jabor, cineasta, jornalista e um dos fundadores do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC - UNE), era um dos críticos da deterioração da cultura popular nos últimos tempos. Ele acompanhava a lucidez de tanta gente, como Ruy Castro e o também saudoso Mauro Dias que falava do "massacre cultural" da música popularesca. Grandes tempos e últimos em que se destacava um pensamento crítico que, infelizmente, foi deixado para trás por uma geração de intelectuais tucanos que, usando a desculpa do "combate ao preconceito" para defender a deterioração da cultura popular.  O pretenso motivo era promover um "reconhecimento de grande valor" dos sucessos popularescos, com todo aquele papo furado de representar o "espírito de uma época" e "expressar desejos, hábitos e crenças de um povo". Para defender a música popularesca, no fundo visando interesses empresariais e políticos em jogo, vale até apelar para a fal

O PESADELO GAÚCHO QUE DESAFIA O "SONHO BRASILEIRO"

O CENTRO DE PORTO ALEGRE COM ÁGUA QUE ATINGIU CINCO METROS DE ALAGAMENTO. Não há como sonhar grande. O risco de cair da cama é total. A terrível tragédia do temporal no Rio Grande do Sul é algo que nos faz parar para pensar. Isso é normal para um país próspero? Falta alguma consciência ambiental no nosso país? Até o fechamento deste texto, 56 pessoas morreram e vários estão entre feridos, desabrigados e desaparecidos. Porto Alegre, Caxias do Sul e Gramado estão entre as inúmeras cidades atingidas por chuvas intensas, vendavais, trovoadas e transborda de rios, entre eles o Guaíba. E nós manifestamos pesar sobre essa traumatizante ocorrência e solidariedade às vítimas. A situação é muito triste, mas não deixa de ser lamentável o oportunismo das subcelebridades, aspirantes a super-ricos, de oferecer doações milionárias para as vítimas das enchentes. Uma sociedade que, em condições naturais, quer demais para si e, egoísta, não quer abrir mão do supérfluo para ajudar o próximo a ter o neces

BRASIL NO APOGEU DO EGOÍSMO HUMANO

A "SOCIEDADE DO AMOR" E SEU APETITE VORAZ DE CONSUMIR O DINHEIRO EM EXCESSO QUE TEM. Nunca o egoísmo esteve tão em moda no Brasil. Pessoas com mão-de-vaca consumindo que nem loucos mas se recusando a ajudar o próximo. Poucos ajudam os miseráveis, poucos dão dinheiro para quem precisa. Muitos, porém, dizem não ter dinheiro para ajudar o próximo, e declaram isso com falsa gentileza, mal escondendo sua irritação. Mas são essas mesmas pessoas que têm muito dinheiro para comprar cigarros e cervejas, esses dois venenos cancerígenos que a "boa" sociedade consome em dimensões bíblicas, achando que vão viver até os 100 anos com essa verdadeira dieta do mal à base de muita nicotina e muito álcool. A dita "sociedade do amor", sem medo e sem amor, que é a elite do bom atraso, a burguesia de chinelos invisível a olho nu, está consumindo feito animais vorazes o que seus instintos veem como algo prazeroso. Pessoas transformadas em bichos, dominadas apenas por seus instin

FLUMINENSE FM E O RADIALISMO ROCK QUE QUASE NÃO EXISTE MAIS

É vergonhoso ver como a cultura rock e seu mercado radiofônico se reduziram hoje em dia, num verdadeiro lixo que só serve para alimentar fortunas do empresariado do entretenimento, de promotoras de eventos, de anunciantes, da mídia associada, às custas de produtos caros que vendem para jovens desavisados em eventos musicais.  São os novos super-ricos a arrancar cada vez mais o dinheiro, o couro e até os rins de quem consome música em geral, e o rock, hoje reduzido a um teatro de marionetes e um picadeiro da Faria Lima, se tornou uma grande piada, mergulhada na mesmice do hit-parade . Ninguém mais garimpa grandes canções, conformada com os mesmos sucessos de sempre, esperando que Stranger Things e Velozes e Furiosos façam alguma canção obscura se popularizar. Nos anos 1980, houve uma rádio muito brilhante, que até hoje não deixou sucessora à altura, seja pelos critérios de programação, pelo leque amplo de músicas tocadas e pela linguagem própria de seus locutores, seja pelo alcance do s