PESSOAS RICAS FANTASIADAS DE "GENTE SIMPLES".
O momento atual é de muita cautela. Passamos pelo confuso cenário das "jornadas de junho", pela farsa punitivista da Operação Lava Jato, pelo golpe contra Dilma Rousseff, pelos retrocessos de Temer, pelo fascismo circense de Bolsonaro. Não vai ser agora que iremos atingir o paraíso com Lula nem iremos atingir o Primeiro Mundo em breve.
Vamos combinar que o tempo atual nem é tão humanitário assim. Quem obteve o protagonismo é uma elite fantasiada de gente simples, mas é descendente das velhas elites da Casa Grande, dos velhos bandeirantes, dos velhos senhores de engenhos e das velhas oligarquias latifundiárias e empresariais. Só porque os tataranetos dos velhos exterminadores de índios e exploradores do trabalho escravo aceitam tomar pinga em birosca da Zona Norte não significa que nossas elites se despiram do seu elitismo e passaram a ser "povo" se misturando à multidão.
Tudo isso é uma camuflagem para esconder uma elite que hoje se faz de generosa mas é autoritária, violenta, estúpida, egoísta e intransigente quanto aos seus pontos de vista. É só dar uma coceira na cabeça que esses "acionistas majoritários", se não da verdade absoluta, mas pelo menos do bom senso, reagem com "invertidas" nas redes sociais, nem que seja para negociar com a realidade os espaços de sentido para suas convicções pessoais.
A "sociedade do amor" que se autoproclama a elite do bom atraso, ou seja, a burguesia que, em 365/366 dias por ano, veste a fantasia carnavalesca de "pessoas comuns", nada tem de amorosa. "Amor" é apenas uma palavra que essa gente sem medo e sem amor usa para se opor ao ódio bolsonarista.
Bolsonaro agora é o fiador das dívidas sociais dessa burguesia enrustida que, no verão do "combate ao preconceito" da bregalização gourmetizada pela intelectualidade "bacana", já sonegou séculos de dívidas com os povos oprimidos ao glamourizar a miséria, com a glorificação das favelas e a espetacularização da pobreza, principalmente através do "funk".
Esse discurso, hipócrita e de alto teor populista, mostrou a falsidade dessa elite que, através de seus representantes nas comunidades acadêmicas, nas celebridades e na imprensa cultural, se achava "mais povo que o povo" demonizando a autêntica MPB para empurrar a bregalização goela abaixo até para o público universitário.
Hipócrita, essa elite do atraso, que era privatista doente, que via a ideia de reestatização como um palavrão, hoje virou "amiga" do Estado forte, já que descobriu que pode pedir ao Lula generosos subsídios estatais para os trabalhos dessa burguesia bronzeada, que pode usar suas fortunas pessoais para o divertimento pleno nesses tempos maravilhosos (para essa elite) de hoje.
Bolsonaro paga as contas de todos os abusos dessa burguesia que, agora, se acha livre dos fardos de 524 anos de atrocidades de seus antepassados. Agora os tempos são "outros" e a burguesia tropical agora professa o "socialismo de butique e de boteco", já que agora não há mais protestos dos excluídos como havia há 30 anos.
Com agricultores famintos desaparecendo, junto a filósofos suicidas e sobrinhos de "médiuns de peruca", debaixo dos arquivos, na contrapartida de feminicidas velhos estarem "vivos e saudáveis" no Wikipedia enquanto seus cadáveres apodrecem devorados por bactérias, insetos e fungos, nossa burguesia ilustrada pode dormir tranquila.
E se proletários, camponeses e universitários estão agora domesticados e obedientes (os universitários, aliás, amestrados pelo ensino provado multiplicado durante os governos FHC), até o neoliberal mais inflexível pode bancar o "esquerdista" e apoiar Lula incondicionalmente, ou melhor, sob a condição de que Lula vai liberar generosas verbas estatais para liberar as grandes fortunas para o recreio pessoal dos "bacanas". Gostar de Che Guevara ficou fácil, pois o guerrilheiro virou o boneco empalhado das elites "esclarecidas" que lutam para parecerem sempre legais nas redes sociais.
Por isso mesmo temos que ficar espertos. O "Brasil único", a "democracia consolidada" de "um só país", só se dirige a poucos. Os mesmos privilegiados de sempre agora se repaginaram e se ressignificaram, mas essa elite do atraso, agora convertida em "sociedade do amor", mudou apenas para permanecer a mesma e, quem sabe, continuar sendo não só a dona do Brasil, mas quem sabe a dona do mundo, já que é uma elite "equilibrada", sem os "fundamentalismos" de africanos e asiáticos e sem as "neuroses existencialistas" dos europeus. Daí nossas elites "bondosas" podem ver, relaxadas, os seriados da Netflix, seguras de que os pesadelos distópicos sul-coreanos e poloneses não vão além das fronteiras espanholas.
Mas é essa elite que continua demonizando os sem-teto das calçadas urbanas, dos camponeses a invadir fazendas improdutivas, dos proletários em marchas de protesto nas ruas, dos pedintes nas sinaleiras. É essa elite que, doante do sofrimento de um aflito, se limita, na sua sorridente hipocrisia, se limitam a aconselhar para "orar a Deus que tudo resolve".
Há seis anos esse pessoal apoiou Bolsonaro para "experimentar". Mas hoje essa burguesia de chinelos vestiu a camisa do lulismo e se julga "socialista desde 1500", mais de três séculos antes de Karl Marx. Para quem "só viu Netflix desde os anos 80", "nunca" consumindo a horrenda mídia venal da Globo, Folha, Jovem Pan, Estadão, Caras etc, faz sentido. E vamos acreditar que atrocidades agora têm o copraite de Bolsonaro e nossas elites agora são tãoboazinhas e zelosas pela democracia que só serve a elas mesmas. Ou então teremos que ficar espertos e tomar cuidado com nossa ingenuidade.
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