Kim Kataguiri, espécie de "olavinho" do movimento estudantil - alusão ao ultrarreacionário Olavo de Carvalho - , ao se tornar o mais novo contratado do jornal Folha de São Paulo, afundou de vez e fez encerrar oficialmente a já declinante era de deslumbramento da grande imprensa paulista.
Houve um tempo em que o jornalismo paulistano era endeusado, como uma espécie de novo messianismo. O jornalista era um ente divinizado que trazia o "milagre" da boa informação. O repórter era visto como um misto de combatente e mensageiro, um "herói" que prometia fazer a sociedade ficar mais inteligente.
O comentarista tentava nos fazer crer que "opinião" era algo que pessoas como ele tinham e que entre nós era um objeto malfeito. Qualquer pessoa, em tese, tinha opinião, mas a "melhor opinião" era sempre a do comentarista, por ele estar dotado de segredos que alega trazer dos bastidores da notícia, dos livros ou de fontes de informação diversas.
Nos anos 90, a grande imprensa se envaidecia por ter "ajudado" a derrubar a ditadura - se bem que veículos que antes defenderam o golpe de 1964 só agiram assim por uma questão de concorrência empresarial contra a supremacia nacional da Rede Globo e a supremacia sudestina dos jornais O Globo e O Estado de São Paulo - e transformava o jornalismo numa seita.
Eu, como jornalista, e, nos anos 90, estudante da Universidade Federal da Bahia, sempre desconfiei dessa glamourização do jornalismo. Quando vieram as "FMs com roupagem de AM" - o rádio AM ainda estava de pé, apesar de massacrado pelo mercado e pelos próprios barões midiáticos - , levantando a bandeira da "informação completa" e da "opinião de verdade", nunca aderi.
E isso, principalmente, quando vieram as rádios noticiosas (all news, definidas pejorativamente pela pronúncia aportuguesada "ounius"), reforçando essa "igreja" da devoção jornalística, mantive meu ceticismo. Falavam que o jornalismo trazia tudo: Educação, cultura, cidadania. Prometia transformar o país num fórum de debates e transformar até mendigos em filósofos. Tudo em vão.
JORNALISMO COMO "SEITA"
A Folha de São Paulo era a "meca" dessa divinização do jornalismo, e Otávio Frias Filho vivia a alta reputação de um guru da "boa informação". A CBN era divinizada até quando derrubou uma rádio de rock de Curitiba, sob a ajuda generosa de dirigentes esportivos locais, que entregaram a antiga Estação Primeira FM para a rede noticiosa.
A Band News também prometia uma "informação diferente" e aí o blablablá radiofônico se impunha como uma "doutrina" na qual se prometia que, quanto mais falatório ouvirmos na Frequência Modulada, mais inteligentes ficássemos. O que foi em vão, até porque, no fundo, informação não é, necessariamente, sinônimo de Conhecimento.
DECADÊNCIA
Com o tempo, a chamada "grande imprensa" surtou. Teve editor que matou colega namorada, dando seu batismo de fogo para os surtos reacionários dos colegas, que passaram a transformar o jornalismo paulistano num antro de boçalidade e obscurantismo.
Os verdadeiros jornalistas, horrorizados, fugiram aos poucos, vendo que as chefias de redação se tornariam, aos poucos, sucursais do PSDB. E, com o tempo, o jornalismo deixou a informação, sua "profissão de fé", de lado, e entrou numa decadência vertiginosa, no qual a antes "imponente" Folha que, com seus textos "enxutos", prometia informação "de qualidade", também se afundou.
É verdade que a revista Veja tornou-se o caso mais típico e que o periódico do Grupo Abril passou a representar o que há de mais abjeto na imprensa, um verdadeiro curso de Jornalismo às avessas, ou seja, ensinando como NÃO se deve fazer na imprensa escrita e, depois, digital.
Evidentemente que mitos passaram a ser derrubados com mérito. Afinal, a opinião pública se esqueceu que a Folha de São Paulo forneceu transporte de presos políticos para o DOI-CODI, temível orgão de repressão da ditadura militar, que Bóris Casoy participou do Comando de Caça aos Comunistas e que os donos do Grupo Bandeirantes são da família de Adhemar de Barros, notório corrupto paulista.
Por outro lado, se ideologicamente o jornalismo ficou mais reacionário, textualmente tornou-se mais precário, chulo, burro. Os textos jornalísticos se tornaram piores, sem personalidade, com erros de português, com informações erradas ou superficiais.
Pior: até o vocabulário ficou mais pobre. Usa-se a patética gíria "balada", jargão tão ridículo e vago que define de apresentação de DJ a jantar entre amigos, assim como não se escreve mais "freguês", e sim "cliente". Chamam de "cliente" até quem compra um pastelzinho numa barraca. Só falta o estúpido prefeito carioca Eduardo Paes rebatizar dois bairros Freguesia (Ilha do Governador e Jacarepaguá) de Clientela, para completar o "espetáculo".
Na música, chama-se de "banda" qualquer grupo vocal, sem se levar em conta a confusão entre "banda" e "bando" ("grupo") do termo inglês boy band, enquanto "banda" só se refere a grupos com instrumentistas. A gente até se prepara para quando chamarem grupos de ginástica fitness de "banda", porque numa imprensa ruim tudo pode acontecer. Já chamam dançarinos de "músicos"...
RAZÕES PARA A CRISE
A combinação de interesses empresariais, de um lado, sempre querendo investir e remunerar menos e faturar mais, e a burocratização (e "burrocratização") dos cursos de Jornalismo, principalmente com a multiplicação de faculdades privadas (que só ensinam para o Mercado e não para o Conhecimento), influem nessa desqualificação do trabalho jornalístico em todos os aspectos.
Daí que esse "jornalismo" só poderia anunciar a "novidade" do colunista Kim Kataguiri. Em outros tempos, mesmo a imprensa mais conservadora tinha grandes colunistas. Otto Lara Rezende e Rachel de Queiroz eram alguns exemplos brilhantes. Mas até Assis Chateaubriand, David Nasser e Carlos Lacerda eram de admiráveis escritas.
Mas é o cenário cultural que temos. Se nomes como Merval Pereira, escrevendo panfletos políticos de péssima qualidade, e Pedro Alexandre Sanches, escrevendo prolixos manifestos pseudo-tropicalistas de valor duvidoso, são "grandes nomes" da nossa imprensa, com seus preconceitos tucanoides sobre política e cultura, respectivamente, faz sentido a contratação de Kim Kataguiri.
Ele, que, com seus textos primários, mal escritos, desinformados e pedantes, mais preocupados em desqualificar o Partido dos Trabalhadores do que em transmitir informação, Kim se torna o "mais novo astro" da grande mídia, afundando o jornalismo paulistano que um dia quis ser referência para o Brasil e que hoje se naufraga no lodo da estupidez, da ganância e do reacionarismo, através da contratação "bombástica" de um colunista de "kimta katiguria" (não, não é erro de digitação).
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