Com os aumentos das passagens de ônibus em várias cidades do Brasil, o Movimento Passe Livre voltou protestando contra os reajustes e pedindo "catraca livre" para os estudantes. Embora os protestos não tenham a intensidade de 2013, ano da onda de protestos populares, manifestações do tipo já aconteceram em várias capitais.
É bastante louvável protestar assim, mas uma pauta que o MPL insiste em evitar é o protesto contra a pintura padronizada nos ônibus, que serve de lona para o "espetáculo" da corrupção político-empresarial que prejudica os passageiros e sucateia os sistemas de ônibus, sobretudo nas grandes capitais.
Sob o véu da pintura padronizada, em que diferentes empresas de ônibus têm uma mesma pintura e uma única empresa de ônibus tem sua frota rachada em até seis ou sete pinturas diferentes, dependendo das áreas em que atuam, há mais burocracia, custos e corrupção para o sistema de transporte, no qual passageiros e rodoviários é que mais perdem.
Sob o véu da pintura padronizada, empresas de ônibus trocam de nome, empresa ruim volta com outra razão social, linhas trocam de empresas, empresas trocam de linhas, e os passageiros são sempre os últimos a saber. De repente, aquela empresa péssima, que todo mundo acreditou estar extinta, volta a circular com um novo nome, mas com o mesmo péssimo serviço.
Até jornalistas se embolam para dizer que empresa é tal ônibus. Se ocorre um acidente com a empresa A, o jornalista menciona a empresa B, porque tem a mesma pintura. E, sob a cobertura da pintura padronizada, outros "recheios" reacionários vêm de carona nesse padrão de sistema de ônibus trazido, dos porões históricos da ditadura militar, pelo "deus" Jaime Lerner.
A demissão em massa de rodoviários para permitir a "bilhetagem eletrônica" é defendida por autoridades que juram que os cobradores e parte dos motoristas serão reaproveitados em novas funções. Conversa para boi dormir. Por debaixo dos panos, os rodoviários são demitidos e a imprensa é, às vezes, proibida de noticiar, por causa do lobby político-empresarial.
A redução de frotas em circulação, que faz com que você, passageiro comum, se irrite com a espera demorada por um ônibus, e é um dos principais alvos de reclamações do povo, é, pasme, vista como "qualidade positiva" pelos tecnocratas do transporte, que acham que menos ônibus nas ruas garantem a "fluidez do trânsito". Só que, havendo menos ônibus, haverá mais automóveis.
Isso os manifestantes do MPL ignoram. Eles ignoram pintura padronizada, redução de frotas e mal conseguem protestar contra a dupla função. Se eles não incluem esses problemas em sua pauta de protestos, a opinião pública não adere a eles e os revoltosos vão naufragar na mesma areia movediça armada pelos "revoltados anti-Dilma".
Imagine ter catraca livre e passagem gratuita se você pega o ônibus errado e se atrasa na ida ao trabalho ou à escola, porque o ônibus tinha a mesma pintura padronizada de outro. Adiantou alguma coisa? Você, no Rio, pega um 328 para a Ilha do Governador achando ser o 378 para Marechal Hermes, o ônibus cai de um viaduto e você morre. Adiantou alguma coisa?
Os estudantes vão felizes pegar ônibus de graça mas é o mesmo ônibus sucateado da extinta empresa A que depois virou empresa X. Vão ser postos no ridículo, seus protestos mais parecerão instintos hormonais de gente de pouca idade do que lutas por causas mais justas, porque os problemas dos sistemas de ônibus não estão só nas passagens caras.
E aí o empresariado vai acionar a imprensa, que às vezes se comporta como house organ das entidades patronais (o jornal carioca O Dia é um exemplo), culpar os protestos estudantis pela decadência. Os estudantes vão ser acusados de provocarem o prejuízo das empresas.
Além do mais, não é mais tendência colocar diferentes empresas de ônibus sob uma mesma imagem bolada pela prefeitura ou governos estaduais. Se uma autoridade disser que "é tendência", está mentindo. É tecnicamente inviável diferentes empresas de ônibus terem uma mesma pintura, mesmo que possam exibir seus nomes ou pequenos logotipos em janelas ou letreiros digitais.
A tendência é cada empresa de ônibus manter a sua identidade visual própria, porque é com ela que se estabelecem relações de serviço e consumo das empresas e dos passageiros. É mais transparente, prático e econômico. O problema é que as autoridades e tecnocratas que estão no poder não sabem disso. Isso é o que dá gente retrógrada se ascender no poder.
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