A recente vitória de Donald Trump nos EUA, assim como a de Javier Milei na Argentina anos atrás, mostra que o legado reacionário de 2016 tornou-se uma grande complexidade que poucos conseguem compreender. Muito poucos.
As esquerdas brasileiras são as que menos compreendem, pois, quando Lula se candidatou ao atual mandato presidencial, elas achavam que podiam tudo. Queriam dar a impressão de que reconquistaram o protagonismo e achavam que tinham o futuro certo em suas mãos.
O próprio Lula tentou reverter o trem da História, mesmo fazendo concessões. Discretamente, o petista foi passando pano no legado de Michel Temer e preferiu implicar apenas com Jair Bolsonaro. Hoje o presidente brasileiro sinaliza pautas que soariam estranhas para ele há 50 anos: cortes de gastos, fim da estabilidade dos servidores públicos, fracasso na proposta de taxar os super-ricos.
Os negacionistas factuais, que boicotam textos que contrariam suas convicções de positividade tóxica, até tentaram impor sua "verdade", mesmo se contradizendo ao defender um suposto esquerdismo ao mesmo tempo "fiel às raízes" e "adaptado aos novos tempos democráticos".
Esse pessoal não admitia que as esquerdas médias brasileiras, que se tornaram a base de apoio de Lula, pegaram emprestado um pretenso protagonismo político, que na verdade estava nas mãos dos neoliberais, principalmente do tucanato "clássico", a "turma da privataria" que, agora, está gerindo a "democracia" da qual os lulistas são apenas atores a interpretar um roteiro alheio.
Imagine um homem emprestando ferramentas para o vizinho realizar suas obras na casa. Pois é. São os neoliberais e a "nata" dos apoiadores "civilizados" de Michel Temer que emprestaram o palco político para os lulistas. Estes não se tornaram os agentes da História, apenas estão atuando em espaços que eles não recuperaram de verdade, pois pegaram de empréstimo do Supremo Tribunal Federal.
A complexidade do golpismo de 2016 desnorteou as esquerdas políticas brasileiras, que acabaram vivendo num mundo do faz-de-conta. Uma grandiloquência do lulismo se forjou e fantásticos relatórios eram comemorados mesmo sem encontrar respaldo na realidade dos fatos.
Nosso país está em crise e está tão frágil quanto há oito anos, e o que vemos é a repaginação da elite do atraso, transformada na elite do bom atraso, a velha burguesia golpista que se converteu na "sociedade legal e democrática dos novos tempos". Ou seja, os netos dos que derrubaram João Goulart em 1964 sonham em ver Lula reeleito.
A burguesia de chinelos tenta fingir que é "pobre", falando português errado e ouvindo músicas ruins, além de "caprichar" no fanatismo do futebol, essa paixão tóxica que contamina o Brasil. Mas é ela que está tomando as rédeas, cooptando para si as esquerdas médias, que se acham "donas da História", mas apenas pegaram emprestado os espaços políticos autorizados pelo neoliberalismo brasileiro.
E assim vemos que a retomada reacionária de Trump pode refletir no Brasil, dentro da polarização do sonho contra o pesadelo que vicia nosso país. Talvez esteja chegando a hora da terceira via crescer e aparecer, criando um terceiro e certeiro elemento para nossa vida sociopolítica: a realidade, há muito tempo abandonada por bolsonaristas e lulistas.
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