Enquanto muitos se preocupam com pastores com camisas de colarinho e gravatas pedindo, aos berros, para que os fiéis ofereçam até seus eletrodomésticos para as igrejas neopentecostais, o perigo maior simplesmente não é sentido por conta do gosto de mel e do aparato de falsa humildade e suposta simplicidade.
Nosso Brasil está atrasado, apesar de uma elite de abastados, tomada de profundo complexo de superioridade em níveis psicologicamente preocupantes, jurar de pés juntos que o país irá se tornar uma nação desenvolvida no final de 2026. Nem em sonhos e muito menos em nenhum esforço de transformar os mais dourados sonhos lulistas em realidade.
Uma prova do atraso brasileiro é que há uma dificuldade em níveis preocupantes de compreender que o pior do obscurantismo religioso não se limita a extorsões da fé manipuladora nos meios de comunicação. E vamos combinar que, embora sejam verídicas das denúncias, o obscurantismo neopentecostal anda sendo superestimado como se nele encerrassem as manobras nefastas sob o verniz da fé religiosa.
Lá fora, não são apenas os pastores os desmascarados. Lá se denunciam, também, as manobras religiosas sob o verniz da "ciência", como a Cientologia, ou sob a máscara do "amor ao próximo", como Madre Teresa de Calcutá, e as denúncias são legitimadas por juristas, jornalistas e acadêmicos, depois de verificarem a consistência dos argumentos.
Aqui, porém, o que se vê, neste terreno, é uma avalanche felpuda de flanelas e panos em quantidades gigantescas para se passar na peruca do "médium" picareta do Espiritismo brasileiro, que, tendo fracassada sua performance de pretenso profeta - com sua "data-limite" que "garantia" que os norte-americanos iriam morar na floresta amazônica e não no Sudeste brasileiro, no caso de uma catástrofe no Hemisfério Norte - , agora tem mais uma "habilidade" póstuma tramada pelos seus adeptos.
Agora, o charlatão vive sua reputação de dublê de dramaturgo.
Isso mesmo. Um falso dramaturgo. Pois depois da falsa nostalgia da novela A Viagem, a canhestra produção que derrubou a TV Tupi e, na sua versão da Rede Globo, quase acabou com a carreira de cineasta de um de seus atores - lembremos que, felizmente, a falsa nostalgia, apesar de persistir, não foi mais longe porque seu elenco pediu cachê para se reencontrar num evento, o que o fez ser cancelado - , agora são os filmes "espíritas" que parecem ter vindo do lixo de algum aspirante a novelista.
Sim, porque é fácil, para novelistas fracassados, emendar duas novelas que parecem iguais nas narrativas e nos personagens, uma de época e outra contemporânea, funde as duas sob o pretexto da reencarnação, joga um moralismo religioso em cima, e, pronto, tem-se o produto da "novela espírita" que faz a burguesia de chinelos chorar copiosamente, como que masturbando através dos olhos, rebaixando a comoção humana a um divertimento mesquinho, não raro às custas da desgraça alheia.
E aí vemos os filmes "espíritas" que seguem sempre a mesma sinopse: o espírito deixa a vida terrena e vai para um terreno cavernoso chamado "umbral". Depois ele é socorrido por funcionários de um suposto hospital denominado "colônia espiritual". Em seguida, é instruído religiosamente e alterna esses momentos com um passeio num bosque. Tudo na mesma, com atuações sofríveis que contagiam até bons atores que se metem nessa roubada.
São aquelas narrativas piegas de velhos dramalhões de conteúdo severamente moralista, mas narrados de forma suave para não despertar desconfiança e fazer a garotada dormir tranquila. Tudo com cenas de multidões de pijamas branquinhos caminhando pelo bosque como um gado seguindo uma mesma direção, lembrando uma versão trash dos velhos comerciais de sabão em pó.
A onda agora é usar o terrível "médium da peruca", o religioso que mais defendeu a ditadura militar, a ponto de ser condecorado pela Escola Superior de Guerra e cujo direitismo faria o coronel Brilhante Ustra ficar de queixo caído. Mas se até as esquerdas médias passam pano no "médium", a ponto de fazer brilhar e (l)ustrar a peruca, então vivemos um sério problema no Brasil.
Afinal, as ideias do "médium" eram claramente dignas do século XII, fundamentadas na Teologia do Sofrimento, na defesa da ideia nefasta de que os oprimidos deveriam permanecer na desgraça, esperando que a "misericórdia divina", não se sabe quando ou em que encarnação, traga as "bênçãos eternas" prometidas.
Mas tem gente iludida que pensou que essas ideias eram "progressistas" só porque eram narradas com suavidade. Um raciocínio puramente algorítmico, medindo o conteúdo da mensagem pela forma com que ela é transmitida.
Por isso mesmo, nosso Brasil anda decaindo a olhos vistos. Para tentar salvar um charlatão religioso, inventa-se qualquer apelo. E se fracassou o falso profeta, se investe então no falso dramaturgo, com o "médium" convertido em "autor" de obras adaptadas para o cinema ou para a novela. Que falta faz um Christopher Hitchens no nosso país!!!!
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