A crise acontece no país. Na cultura, não é diferente. Mesmo assim, a chamada "boa sociedade", que se julga formadora de opinião e quer que seus pontos de vista prevaleçam, não gosta que falemos desta realidade.
No Rio de Janeiro, há quem procure a aura perdida dos "anos dourados" - o chamado "borogodó", segundo a gíria popular carioca - até em vídeocassetadas. Há pessoas que se sentem ofendidas quando alguém fala em crise, e, por isso, tentam arrumar desculpas ou simplesmente reagem com fúria e grosseria.
Vamos às desculpas, já que elas tentam criar uma realidade que não existe. São pessoas que tentam qualquer tipo de argumento para dizer que tudo está bem, às mil maravilhas, que vivemos o melhor momento e blablablá.
Isso se dá sobretudo entre aqueles que sentem horror em saber que existe um livro como o meu, Música Brasileira e Cultura Popular em Crise, que não lembra aquelas obras animadas de vlogueiros "filosofando" sobre espinha na cara e livros sobre vampiros e Minecrafts.
Vamos lá, apontar algumas desculpas, várias delas tolas e mais típicas para dizer que não existe crise cultural, dadas por pessoas que não percebem questões delicadas e sérias como espaços de divulgação, mediocridade dominante no mercado, mídia decadente etc.
1) "Crise? Aonde, meu amigo? Minha filha foi cantar MPB numa festa de aniversário com vinte pessoas e saiu muito aplaudida".
2) "Não vejo como haver crise na nossa cultura, A Lei Rouanet está investindo adoidado em cultura. Além disso, é só dar mais dinheiro que o 'funk' e o 'sertanejo' melhoram".
3) "Só para provar que a cultura está muito bem, obrigado, aquele músico de MPB apareceu naquele programa de fim de noite de um canal comunitário da TV paga. E deu um show".
4) "Pois aquele novo CD do 'pagodeiro romântico' tal estava muito bom, cheio de ótimas canções" (Obs.: em maioria covers de MPB e, nas medíocres canções autorais, o embelezamento fica por conta de um arranjador especialista de plantão).
5) "A gente foi tocar na rua e umas quinze pessoas aplaudiram. Foi maneiro. A gente arrecadou, num dia, R$ 49,30 por nossa apresentação. Foi demais".
6) "As pessoas estão lendo mais. Veja só a 'galera' lendo livros de youtubers, vampiros, Minecrafts, cachorro com nome de roqueiro, auto-ajudas em geral, o mercado literário está bem aquecido".
7) "O pessoal anda interagindo com o teatro. Você vê as peças das franquias da Disney e da Marvel, lotação esgotada! E aquela comédia, 'Deu a louca na gostosa', sucesso absoluto, abriu mais uma temporada, com apresentações extras, por causa daquela atriz gostosa que faz a cena da secretária que se agacha para pegar um livro que caiu no chão".
8) "Uma festa de rock foi o maior sucesso. Trinta pessoas naquela boate nos 'cafundós do Judas'. Todo mundo que estava na comunidade do Facebook foi, exceto umas cinco ou três pessoas. Foi o acontecimento do ano".
9) "Está surgindo muito nome do 'funk', 'sertanejo', 'pagode' e tudo o mais, não sei o que deu na sua cabeça essa crise cultural. As rádios não param de receber centenas de novos discos, e eles vendem bem, vão para altas posições nas paradas de sucesso. Tudo bom demais, não é?".
10) "Acho muito relativo esse problema de crise. Se percebermos bem, vivemos um período fértil de muita coisa. Acho até que uma explosão de criatividade que já causou uma grande revolução, que só você não consegue enxergar" (O cara se esquece que muitos dos grandes talentos até existem e produzem coisas legais, mas a mídia e o mercado não lhes dão visibilidade necessária e preferem as porcarias).
Comentários
Postar um comentário