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EMPRESÁRIOS DE RÁDIO COSTUMAM TER PRECONCEITO COM ROQUEIROS


Por trás desse "mundo encantado" das FMs comerciais que se dizem "rádios rock", há uma situação que pouca gente consegue perceber. É o preconceito absurdo que os empresários dessas rádios têm em relação ao público roqueiro.

Para começo de conversa, empresário de rádio nunca foi favorável à segmentação. Sobretudo em FM. Até os anos 80, eles resistiam e até davam gargalhadas quando alguém vinha com essa ideia, e, nos anos 90, eles apenas cederam parcialmente, aceitando a segmentação "em termos".

Existe uma confusão muito grande que ronda o conceito de "rádio jovem", algo muito vago e impreciso. É como definir vários tipos de suco, chá e bebidas leitosas e alcoólicas como simplesmente "água". Alguém criaria uma "loja de água"? Café, suco de laranja e vitamina de mamão são iguais porque simplesmente têm em comum a água?

Essa confusão permite que rádios explorem o perfil rock mantendo um estilo de locução, linguagem e grade de programação de rádios de pop, o que é muito, muito diferente. O estilo de locução é um dos maiores problemas, já que os locutores parecem deslocados diante do repertório roqueiro que anunciam.

Este problema tem como raiz um fato ironicamente criado pelo fenômeno Rádio Cidade, quando ela era associada ao perfil pop. Seu sucesso estrondoso gerou milhares e milhares de emissoras imitadoras, e criou uma demanda muito grande de locutores que o mercado explodiu e saturou de vez.

Por outro lado, havia as rádios de rock que adotavam outro tipo de locução. Nada de voz afetada de animador de festas infantis, mesmo que fale calminho, pausado e não conte piadinhas. Eram locutores com vozes comuns, como jornalistas musicais falando na imprensa.

Só que o problema é que o mercado de radialismo rock não cresceu e, quando veio o Rock In Rio, a revoada de pombos disparou para o milharal do vizinho e uma parcela de locutores pop encontrou brechas para entrar nas rádios comerciais que adotavam o perfil rock e posar de "roqueiros" sem ter coisa alguma do estilo de locução e linguagem de rock.

Muitas rádios de pop ou popularesco chegaram mesmo a manter a mesma equipe quando migraram para o rock, sem fazer qualquer adaptação. A única coisa que essas rádios costumavam fazer era contratar dois ou três produtores com algum conhecimento de rock (geralmente superficial) e montavam o repertório previamente decidido pelas gravadoras.

Isso é uma falta de respeito e de discernimento aos roqueiros. Eles são tratados como se fossem iguais aos fãs de dance music. Nem para substituir o quadro de locutores é feito por essas rádios, e o que se notou nelas, como se nota hoje na 89 FM paulista e na Rádio Cidade carioca, é que o formato de "rádio rock" se limita apenas a rádios pop convencionais com vitrolão roqueiro.

Quando uma rádio de rock autêntica é adquirida por uma rede de FMs pop, ou de rádios evangélicas, noticiosas ou popularescas, há um esforço de substituir toda a equipe e trocar por uma que se adeque aos perfis das novas rádios.

Infelizmente, porém, quando uma rádio de pop convencional ou de música popularesca migram para o rock, isso não é feito. Não há uma substituição de locutores, mesmo quando parte deles poderia ser facilmente deslocada para outras emissoras ou para serviços de relações públicas ou assessoria. Os mesmos locutores que diziam "alô, dona-de-casa" e anunciavam Fábio Jr. e Wando, no mês seguinte, estavam anunciando Ramones e Metallica dizendo bobagens do tipo "demais, né?".

Isto aborrece, e muito. E foi insuficiente a Rádio Cidade adotar a locução mais calma e pausada, porque isso a FM O Dia também fez. Aquele estilo "locução da Mix FM depois de tomar Maracugina". Isso não é locução de rádio de rock, até porque as vozes continuam afetadíssimas, com aquele ranço de animador de festinhas infantis.

Os executivos de rádio têm preconceito enorme com roqueiros. E diz-se dos executivos que tentam abraçar a causa, se fazem de solidários, mas acham que os fãs de rock são iguaizinhos aos de nomes como Justin Bieber, One Direction e Britney Spears. Imagine confundir um fã de Iron Maiden como se fosse fã de Justin Bieber e reservar a ele o mesmo tipo de locutor de rádio!

A mentalidade "só sucessos", a grade de programação que mal consegue disfarçar seu caráter hit-parade. São programas de flashback disfarçados de "clássicos do rock", programas de "mais pedidas", "duras horas sem comerciais", "as mais tocadas" dissimulados pelo rótulo "rock", que não são feitos para cobrir tendências do rock, e sim tocar somente os "grandes sucessos" do gênero.

Isso revela o quanto executivos de rádio têm um preconceito com o rock. Acham que não se pode contratar roqueiros autênticos para a locução de rádio pelo preconceito que tem de ver o roqueiro, neste caso, como um brutamontes com jaqueta de motoqueiro.

Só que esse preconceito é inútil, porque eles acabam vestindo seus locutores animadinhos da mesma jaqueta pela qual discriminaram os roqueiros. Muitos roqueiros de verdade nem usam jaqueta de couro e são muito menos barra-pesada que muito locutor "gostosão" que entra numa "rádio rock" sem entender do ramo, mas para se jogar na plateia e conquistar a mulherada.

Os locutores da Rádio Cidade continuam sendo os mesmíssimos que, quando a emissora ainda usava a franquia da Jovem Pan FM, anunciavam o mais débil pop dançante. Para piorar, o coordenador da rádio do "rock de verdade" foi um figurão da antiga Beat 98 (popularesca) cuja vivência mais próxima do rock foi tocar ídolos do "sertanejo universitário".

Daí que isso é uma grande falta de respeito contra os roqueiros. Os fanáticos que aceitam qualquer coisa em nome do rock estão errados, porque eles pouco se preocupam com a qualidade, ficam copiando nomes de bandas de rock no Wikipedia para pedir para uma Rádio Cidade tocar, nomes que esses "roqueiros convictos" não têm ideia sequer vaga do que são ou foram.

Afinal, o que temos que levar em conta é que o segmento rock é dotado de caraterísticas que não podem ser as mesmas das rádios de pop dançante ou popularesco. A linguagem, a mentalidade, a grade de programação, são outras.

Daí que uma rádio, que promete tocar "só rock" mas mantém a linguagem e a mentalidade de rádio pop, pode até forçar a barra para ter um máximo de respeitabilidade, mas em dado momento não consegue convencer os roqueiros mais autênticos.

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