O FATO DE HAVER MUITA GENTE GOSTANDO DE PÃO COM MORTADELA NÃO SIGNIFICA QUE TODOS SEJAM OBRIGADOS A GOSTAR DESSE RECHEIO.
Diz a filósofa e professora Marilena Chauí que a classe média, a abastada, é autoritária. E isso reflete até mesmo no prazer humano, pois existem padrões de “prazer” que nem todos querem ou precisam seguir na vida, mas são forçados a seguir pelas conveniências sociais, com efeitos sociais danosos. Vide os feminicídios, consequência da obrigação de todo homem ter que ter uma mulher para namorar ou casar, myitas vezes sob a pressão de amigos.
Daí que o Brasil tem a liberdade de instintos que escraviza a consciência, padroniza formas de conduta e comportamento e espalha a mesmice de uma multidão que, salvo honrosas exceções, parece ser como o caipira da colina dos EUA, o hillbilly ensimesmado, bitolado e desatento que vai onde o “gado” está indo, ainda que seja em direção ao abismo.
Fala-se em diversidade, mas mesmo a ideia do presidente Lula significar, em tese, a diversidade brasileira, não se busca uma diversidade de candidatos. Vivemos numa fase de mediocridade, de padronização de comportamentos, tudo isso expressão de uma sociedade infantilizada, hipermidiática e hipermercantil.
E isso reflete na alimentação, onde os sabores não valem por si, mas pelo grande público que o consome. Se pizza e espaguete são deliciosos, pouco importa, o que importa são as conveniências sociais em jogo. Assim como a cerveja, de sabor ruim. Até novidades deliciosas como pistache e açaí servem mais como agregadores da mesmice do que como opções de sabor. “Eu sigo porque todo mundo está seguindo”.
O dia que o veneno de rato virar moda, aí vai ser um perigo. Mas também o hedonismo se serve também do cigarro como símbolo de ascensão social e um dos componentes que esta droga contém é justamente o veneno de rato. Não é só o metanol nas bebidas que é mortífero. O “prazeroso” cigarrinho, a nicotina das folgas relaxantes, também leva muita gente para o caixão.
Mas isso é outra história. E, voltando à alimentação, vemos a falta de variedade e a sutil condenação ao direito de escolha que envolve produtos como o presunto e a mortadela, que exercem um quase monopólio no cardápio brasileiro comum.
No que se di ao pão, as pessoas não podem comê-lo puro, sem recheio, sem sofrer uma sutil advertência. Quase como dando uma ordem, colegas de trabalho indicam que a “mortandela” está na geladeira. Ficam assistados em ver o indivíduo comendo pão puro, sem recheio.
No caso dos rissoles, o que causa estranheza numa cidade considerada cosmopolita como São Paulo é o monopólio do sabor queijo com presunto, não oferecendo outras opções de sabor do simpático salgadinho. É difícil encontrar até o sabor carne, quanto mais sabores como camarão, um dos sabores mais refinados do rissole.
O presunto também é um sabor hegemônico no pão italiano, embora este tenha que concorrer quase de igual a igual com o sabor frango. Mesmo assim, a supremacia do presunto é notória e, no caso deste sanduíche, nem é o melhor sabor. O de frango com queijo é mais saboroso e muito mais saudável.
Aliás, nessa sociedade em maioria tóxica que é a brasileira, nem sempre o que é mais popular é o melhor. E, no caso de presuntos e mortadelas, há coisas mais saudáveis e deliciosas. Que se goste de presunto e mortadela, como de outras coisas populares, vá lá, mas não é porque muitos gostam que se torna obrigatório gostar e aderir. Impor prazer tira mais o prazer do que dá.
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