O uso de plataformas das redes sociais digitais é fora do normal. O gosto musical se alterna entre o brega-popularesco nacional e o hit-parade estrangeiro. A linguagem inclui "dialetos" em inglês como dog, boy, bike e um tal de body agora atribuído ao maiô, jogando fora décadas de aportuguesamento do termo galicista maillot. A gíria "balada" (© Jovem Pan) também é corrente no seu vocabulário.
Na literatura, prefere ler obras que fujam do pensamento crítico, também discriminado nos meios acadêmicos. No teatro, a preferência é que seja o mais americanizado possível, sob a desculpa de ser "urbano e contemporâneo". Sentem obsessão por reality shows. Seu mercado de trabalho prefere gente "divertida" a talentosa. Seus jovens riem de forma descontrolada quando conversam. A obsessão por festas atinge níveis estratosféricos. A religiosidade também é elevada.
Trata-se do povo brasileiro como um todo ou da espécie humana por excelência, certo? Trata-se de um modelo de sociedade que deve ser considerado ideal para o resto do mundo, "perfeita" nas suas imperfeições, mas que é considerada superior por seus indivíduos?
Erradíssimo!!
Este comportamento descrito nos dois primeiros parágrafos é apenas uma amostra do que é a elite do bom atraso, a "boa" sociedade dos dias de hoje. Nos últimos meses ando adaptando o termo "elite do atraso" do sociólogo Jessé Souza a um tipo "positivo", que considero oriundo, nas caraterísticas contemporâneas, ao golpe militar de 1964, embora sua ascendência remete às elites escravocratas seguidas dos fisiologistas políticos da República Velha.
A elite do bom atraso, portanto, tenta sobreviver a seu passado sombrio e hoje tenta parecer "tudo de bom": falsamente moderna, vanguardista, alternativa, esquerdista etc. Essa elite do privilégio quer ser vista como "a mais legal do planeta" e se esconde sob o povo, sendo portanto uma burguesia de chinelos que, de vez em quando, troca seu Moet Chandon com caviar pelo aguardente com angu.
Esse mimetismo é típico de gerações mais recentes, que incluem sobretudo empresários do entretenimento que adotam estratégias de forjar uma falsa projeção mundial do Brasil, indo desde parcerias com o megaempresário Max Martin, que hoje empresaria a cantora Anitta, até duetos forjados como Demi Lovato e Luísa Sonza, Jessie Ware e Pabblo Vittar e até o fiasco do concerto de Rod Stewart com a canastrona Ivete Sangalo, até a "espontânea" cover de "Evidências" tocada pelo tecladista de Bruno Mars, John Fossit.
Esse empresariado do entretenimento, espécie de "Faria Lima de t-shirt", são os novos super-ricos que "desenham" o comportamento padrão que, supostamente, parece ser de todo o povo brasileiro, pois a elite do bom atraso tem um raio de alcance que vai do pobre remediado, que introduz na vida real o comportamento estereotipado do "pobre de comédia", até o famoso (inclui subcelebridades e até semi-anônimos das colunas sociais) cheio da grana, um super-rico que só não tem poder de decisão nos processos político-econômicos gerais, mas têm o mesmo patrimônio financeiro na conta bancária.
Portanto, só porque essa elite, com apetite desmedido para o consumismo - a ponto de, quando conquista a sorte grande financeira, prioriza o supérfluo e o fútil deixando outras pessoas com necessidades econômicas reais na mão - , é voltada ao entretenimento, ao coloquialismo e ao aparente senso de humor, não significa que ela possa ser o modelo de humanidade não só para o Brasil, mas para o resto do planeta, como se somente essa "boa" sociedade prestasse no mundo. Pelo contrário, é uma elite atrasada e cheia de problemas e, como elite, tem seus interesses meramente privativos.
Ainda vamos falar muito da elite do bom atraso.
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