Em que pesem os pontos positivos que hoje se avaliam, na distância do tempo, trazidos pelos governos do ex-presidente Lula, o Brasil não tem tradição de ser país socialista.
Depois do faz-de-conta do pseudo-esquerdismo que fazia muitos valentões da Internet fingirem não serem reacionários, dissimulando o reacionarismo que se manifestavam no âmbito cultural com uma fingida simpatia pelas esquerdas, o pessoal saiu do armário.
Daí vieram os "coxinhas", "bolsomínions", os "febres-amarelas" que pedem até intervenção militar, às vezes usando um inglês tão grotesco que não é mais de cursinho ruim, mas de algoritmo dos tradutores digitais.
São as mesmas pessoas que, dez anos atrás, fingiam abominar o Imperialismo e o FMI e hostilizavam o George W. Bush por ser um reaça cômico do que um direitista convicto.
E fingiam também seguir Emir Sader, ler Caros Amigos, admirar Ernesto Che Guevara, se autoproclamarem "esquerda-liberal" no antigo Orkut.
Isso até as circunstâncias lhes permitirem até mesmo pedir a volta da ditadura militar e despejar todo tipo de preconceito social digno dos piores senhores de engenho do Brasil colonial.
Evidentemente, temos gente progressista no país, pessoas que brilhantemente estão até ensinando leis, jornalismo, cidadania, economia e tudo o que os "tarimbados" deixaram de fazer.
Temos o portal Justificando, que analisa as leis com muita coerência, e o Diário do Centro do Mundo, que dá um banho na grande imprensa na divulgação de informações de fatos diversos.
Mas nem todo mundo na praia progressista, seja os esquerdistas ou declaradamente "nem de esquerda nem de direita", está aí senão para surfar na onda do momento.
Às vezes gente antes empenhada em boas causas comete tropeços fatais.
Como o senador Humberto Costa, do PT pernambucano (Estado natal de Lula), pedindo, no dia 19 do mês passado, para o partido abandonar o discurso de "denúncia do golpe" e compactuar com o anti-petismo da revista Veja, o último veículo que o parlamentar poderia escolher para fazer seu desabafo.
Humberto tentou alegar que sua entrevista foi distorcida, nesta primeira tentativa de apagar as marcas do beija-mão.
Depois veio outro beija-mão. Desta vez na festa de aniversário de 50 anos de carreira do jornalista Ricardo Noblat, um dos "soldados" do "jornalismo de guerra" da imprensa venal.
Estavam presentes o presidente Michel Temer, o senador e presidente do PSDB, Aécio Neves, e outros membros da plutocracia política, empresarial e midiática.
Mas também estava presente o deputado federal Chico Alencar, do PSOL.
Conhecido por suas pregações em favor do "funk" - hoje envolto em relações políticas com o PMDB carioca - , Chico Alencar, fora disso, até parecia ter um trabalho pertinente.
Mas aí ele foi ao jantar e disse, entre outras coisas, que Aécio era "diferente" dos senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, e por isso beijou a mão do mineiro.
Numa conversa com Temer, alguém disse que o presidente poderia ficar quarenta anos no poder. "Se for com os aplausos de Chico (Alencar), tudo bem", disse Temer.
O psolista respondeu, animadamente: "A esquerda adora um continuísmo".
Depois do incidente, Chico Alencar divulgou um vídeo dizendo que "errou".
Ele alegou que as declarações que ele deu na festa eram "ironias" e que se "arrependeu" de ter ido ao jantar, temendo ser interpretado por estar convivendo com os adversários.
Disse que sua trajetória política de "combate aos podres poderes" não pode ser inibida por "duas ou três horas de uma noite".
Como Humberto, Chico tentou apagar as marcas do beija-mão na plutocracia.
E, agora, foi com um intelectual que nunca foi declarado esquerdista, mas tinha a simpatia do meio.
Leandro Karnal, o "filósofo pop", que havia sido uma das vozes consistentes contra o valentonismo nas mídias sociais e contra a "cultura do ódio", resolveu compactuar.
Apareceu num jantar com o juiz da Operação Lava Jato, o midiático Sérgio Moro, e o amigo deste, o juiz Anderson Furlan.
Karnal escreveu a seguinte mensagem em seu perfil no Facebook.
"Dia intenso em Curitiba. Encerro com um jantar com dois bons amigos: juiz Furlan e juiz Sergio Moro. Talvez não faça sentido para alguns. O mundo não é linear . A noite e os vinhos foram ótimos. Amo ouvir gente inteligente. Discutimos possibilidades de projetos em comum".
Muitos seguidores o abandonaram em grande debandada.
Karnal manifestou cumplicidade justamente com um dos ídolos dos sociopatas que o intelectual tanto combatia.
Cogita fazer parcerias com Moro e o definiu como "inteligente".
Até o momento não se divulgou um "mea culpa" como as do senador petista e do deputado psolista.
Mas mostra o quanto nos meios progressistas há deslizes graves que podem pôr tudo a perder.
E isso é sério quando vemos que a plutocracia faz de tudo para permanecer no poder e salvar seus interesses particulares, sob o pretexto de "combater a recessão".
Apesar do favoritismo de Lula nas pesquisas de intenção de voto para 2018, nada garante sua volta, porque a plutocracia é capaz de tudo para impedir sua volta.
Temos que tomar cuidado. A nossa direita é gulosa.
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