Nas narrativas oficiais trazidas pela mídia patronal e compartilhadas pelas redes sociais, Lula é o “único” candidato da democracia pela inexistência de opções de voto convincentes. O resto é uma direita ao mesmo tempo neurótica e atrapalhada, que, segundo essas narrativas, desmerece o voto popular.
A ideia de “ou Lula ou nada” traz uma grande estranheza: o apoio de setores da alta sociedade que estariam supostamente entusiasmados com o lulismo e que teriam se adaptado aos “novos tempos” de “união e solidariedade”. Tudo parece um discurso maravilhoso, capaz de fazer a maioria da “nação” do Instagram e do Tik Tok dormir tranquila o sonho dos anjos.
Mas há um ditado popular, subestimado no Brasil, que traz um alerta: “Isso é bom demais para ser verdade”. O ditado se refere a tudo aquilo que parece vantajoso e maravilhoso demais e desperta desconfiança por conta disso.
Lula recebendo apoio da burguesia? Lula se aliando à burguesia? A realidade dos fatos mostra que não foi a burguesia que mudou, virando um primor de generosidade humana e responsabilidade social, mas foi Lula que mudou, e foi para pior.
Isso é tão certo que vejo um semblante evasivo de Lula, como se quisesse evitar olhar para as caras das pessoas. Tenho que observar isso. O petista se tornou mascote da Faria Lima e uma espécie de mordomo da burguesia ilustrada, a ponto de fingir fazer treta com as elites para fazer bonito nas redes sociais.
Lula não mede recursos para a compra de votos do Legislativo, prática que agora é definida pelo nome “técnico” de “verbas para emendas parlamentares”. Mas estabelece limites para o reajuste do salário mínimo. O petista hoje atua como um pelego e só a burguesia ilustrada sai em defesa dele, sobretudo através do “isentão” dos tempos atuais, o negacionista factual.
O povo pobre da vida real é que se decepcionou com Lula. É verdade que isso tem muito do dedo das seitas neopentecostais, mas até isso saiu do controle. Hoje o antipetismo ultrapassou os limites da direita política e a revolta popular contra Lula fugiu do estereótipo do “pobre de direita”.
No outro lado, a burguesia “consciente” e que se fantasia de “gente simples” - de forma tão grosseira que isso inclui fazer autoatendimento em postos de combustíveis e encher a cara de cerveja nos bares durante a madrugada - está feliz com Lula. Vendo o barco da direita naufragando, as classes dominantes estão migrando para o cruzeiro marítimo de Lula, tirando os anéis para proteger os dedos e as gravatas e colares para proteger os pescoços.
O próprio Lula, capaz de dizer que as lutas sindicais estão “obsoletas”, viu mais vantagem estar ao lado dos ricos que representam a elite “democrática”. Enquanto o petista se afastou de antigos aliados da esquerda raiz dos primórdios do PT, direitistas como José Sarney, Eduardo Paes e Mário Kertèsz se tornaram seus “amigos de infância”.
A burguesia ilustrada não quer que se saiba o que ela fez no verão passado. Tanto que ela se recusa a se assumir como tal, preferindo se passar por “mais povo que o povo”. Se achando uma classe cool, a burguesia ilustrada não quer ser conhecida por uma imagem socialmente negativa, daí o mundo de faz-de-conta que se institui nas redes sociais, com reflexo na vida cotidiana.
Por isso, as coisas mudam, nem sempre da forma que desejamos. E às vezes as pessoas também mudam e não é por ser Lula que ele deixe de estar sujeito a isso. Daí que a burguesia ilustrada é que mais blinda ele, enquanto o povo pobre real segue desconfiado com o presidente.
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