Nós últimos dias o bolsolavajatismo, base operacional do período golpista de 2016-2022, começa a ser desmontado. A cassação de Carla Zambelli, Alexandre Ramagem e Eduardo Bolsonaro e as primeiras denúncias de grampos ilegais de Sérgio Moro, além da prisão do próprio Jair Bolsonaro, mostram a reviravolta daqueles que eram vistos como “heróis” dos chamados “cidadãos de bem”.
No entanto, temos que ter cautela e muita calma nesta hora. Afinal, o protagonismo artificial das esquerdas, sob clara suavização de suas agendas - a regulação da mídia e o aborto estão entre as pautas descartadas - mostra que os esquerdistas negociaram, sim, com a direita moderada, para retornar ao poder em 2022.
São as mesmas forças que derrubaram Dilma Rousseff, abrindo caminho para Michel Temer e seu pacote de maldades, cardápio político que preparou a chegada de Bolsonaro, que realizou brechas para o retorno de Lula ao Palácio do Planalto.
Lula voltou estranho, e no terceiro mandato ele passou o primeiro ano viajando e o segundo fazendo comícios, em vez de trabalhar para o país. Queríamos ver Lula acompanhando pessoalmente a reconstrução do Brasil mas o presidente brasileiro queria reconstruir antes a Ucrânia e construir a nação Palestina.
Só a burguesia ilustrada está empolgada com Lula e aceita vê-lo viajando e festejando antes da real reconstrução do Brasil, que ainda não deu sinais de ter acontecido. Para quem está bem de vida, tanto faz reconstruir com clima de festa e menos trabalho. Daí que Lula tornou-se pelego, deixando os pobres à mercê da pobreza “suportável”, enquanto festeja sua liberdade pessoal abraçado aos empresários da Faria Lima, com os quais o presidente brasileiro finge criar tretas.
Tudo parece bom demais para ser verdade, uma quebra brusca da linha do tempo do golpe de 2016 liberada pelas mesmas forças golpistas. Ver as mesmas elites que derrubaram Dilma Rousseff apoiarem a reeleição de Lula é algo para se questionar. Afinal, porque nossas elites parecem ter mudado de posição?
Não podemos ser loucos e achar que a História foi uma alucinação e que todas as atrocidades agora se reduzem ao bolsonarismo. A elite do atraso inclui muita “gente boa” que agora se diz “esquerdista desde 1500”, ocultando o fato de serem filhos de pais e mães opulentos do “milagre brasileiro” e netos de avôs e avós que bradavam pela queda de Jango.
Sim, o bolsonarismo e o lavajatismo são muito nocivos. O bolsonarismo é um movimento político reacionário e sustentado por milícias. O lavajatismo é uma forma brasileira de lawfare, com a transformação na Justiça numa ferramenta de truculência jurídica, muitas vezes feita ao arrepio das leis.
Mas reduzir o mal da humanidade a esses fenômenos é perigosamente primário e perigoso. Assim como é perigoso reduzir o mal religioso às igualmente nocivas seitas neopentecostais, enquanto o Espiritismo brasileiro, sustentado por ricos proprietários de terras do Triângulo Mineiro e de Goiás, muitos acumulando assassinatos sob seus mandos nas costas, chega a ser um mal maior.
Afinal, o Espiritismo brasileiro se consagrou produzindo literatura fake que bota na conta dos mortos o que eles nunca defenderam, sobretudo as ideias fundamentadas na Teologia do Sofrimento, o suprassumo do obscurantismo da fé medieval, disfarçado de racionalidade futurista. A defesa de ideias ultraconservadoras sob um discurso melífluo e o uso abusivo das identidades dos mortos fazem com que a dita "religião do amor" seja mais perigosa e traiçoeira do que as seitas neopentecostais.
Não custa lembrar que o Espiritismo brasileiro esteve entre as religiões que mais apoiaram o golpe militar de 1964. Seu "médium" mais famoso foi um incurável apoiador e colaborador do poder ditatorial e em nenhum momento defendeu a redemocratização do país. E o Espiritismo brasileiro também apoiou o lavajatismo e o golpe político de 2016, praticamente "abençoando" as maldades do então presidente Michel Temer.
Devemos entender, portanto, que o desmonte do bolsolavajatismo, ou seja, o combo reacionário que reúne o bolsonarismo e o lavajatismo, é apenas uma virada de página de um longo livro, não sendo de forma alguma capítulo final do combate ao ultraconservadorismo. Ainda temos muito legado da ditadura que ainda é visto como “relíquias valiosas”.
Cabe combater esse entulho fantasiado de tesouro que engana muita gente. Até porque o culturalismo brega e piegas da ditadura criou condições para o golpismo de 2016 e o bolsonarismo. Foram as esquerdas curtirem os “brinquedos culturais” da direita e o Brasil mergulhou nas trevas de 2016-2022. Convém evitar que se repita esse desastre.
Comentários
Postar um comentário