Diante da ganância da elite do bom atraso, da burguesia de chinelos invisível a olho nu, se destaca o protótipo muito comum do pai de família abastado e ranzinza, um bem de vida que é sempre um mal agradecido, um homem que parece viver da Síndrome das Obrigações Intermináveis.
Ele geralmente é um patrão que tem mania de achar que tudo na vida é cumprimento de dever. Ele tem tudo nas mãos, tem um bom ganho financeiro, mas parece nunca estar satisfeito com coisa alguma. Ele fica zangado com tudo na vida, parece que ele faz tudo por mera obrigação, sempre carrega uma cara de incomodado, sugerindo que quase não tem prazer na vida, quase não tem alegria de viver.
Ele tem que levar a família ao shopping center fazer compras e almoçar num restaurante de bom conceito. Ele tem que dirigir seu carro de modelo do ano corrente. Ele tem que pagar salários para os empregados de sua empresa, tem que pagar as babás ou governantas de sua casa. Ele, sendo de classe média, ainda não pode se isentar de pagar impostos "por fora", tendo que encarar contas a pagar.
Ele sempre vive mal-humorado. Tem muita dificuldade de se alegrar com algo - geralmente quando assiste a um filme comercial estadunidense ou a uma partida de futebol na TV - , mas tem muita facilidade de se irritar com a menor coisa.
Vive estressado por nada. Ele sempre mostra aquela cara de cansado, aquela cara de quem aguenta tudo com paciência, mas com certa má vontade. Um tipo de cara que acha que não pode ser incomodado por pessoa alguma, mas se sente incomodado com a vida que leva.
Certa vez, ele falou durante o celular e um pedinte resolveu pedir dinheiro para ele, bondosamente e de maneira muito educada. Antipático, o pai de família disse que "estava falando pelo celular" - provavelmente algum problema de ordem profissional - e o pedinte, constrangido, foi embora.
Este é um retrato individual de quem está bem de vida mas que parece não estar satisfeito com coisa alguma. Gente que ganha fácil demais sem ter necessidade. Gente que tem tudo que não precisa, que talvez nem ame sua esposa como deveria e nem eduque seus filhos como lhe cumpriria fazer, sendo apenas um mero acumulador de dinheiro e privilégios, tão frio que talvez nem se disponha a agradecer ao destino por tudo que tem.
Ele pode não ser um indivíduo típico dessa elite que dominou o poder no Brasil dos últimos anos. Mas é um tipo que existe aos montes neste país sofrido como o nosso.
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