Hoje parte da mídia e setores da opinião pública fogem da raia, mas a verdade é que, nos anos 1990 e 2000, a Jovem Pan e a Folha de São Paulo simbolizaram os paradigmas da dita "mídia moderna".
A estética visual da Folha, com seus cadernos com o cabeçalho envolvido em retângulo que variava de cor conforme o bloco de notícias: Cotidiano, Esportes, Ilustrada etc. Essa estética eu vi copiada pelo jornal impresso da Rádio Metrópole, em Salvador.
Os textos enxutos e curtos, o rigor na elaboração de lides e sublides e a cobertura insípida - que o jargão jornalístico define como "isento" - era adotado pelo Projeto Folha do finado Otávio Frias Filho anos antes do periódico surtar e concorrer, em reacionarismo, com o Estadão.
Esses procedimentos durante muito tempo foram considerados pelo mercado midiáticos como "verdades absolutas" da dita objetividade jornalística, que se sustentava pelo mito da imparcialidade, hoje considerada uma ilusão.
O que tivesse de jornal considerado "moderno" e adotasse uma linha editorial "contemporânea", nos anos 1990, obrigatoriamente tinha que se espelhar na Folha de São Paulo, que para as esquerdas médias de então gozava de uma relativa "rivalidade" com o jornal O Globo, pois na época havia um falso contraste no interior da mídia corporativa. Mídia reacionária era a Rede Globo, O Globo, a Veja e o Estadão. Já a Isto É, a Folha de São Paulo e a Bandeirantes eram a "mídia boazinha", "imparcial" e "equilibrada".
No rádio, a Jovem Pan "exportava" seu padrão de programação e locução. Nomes como Emílio Surita e Celso Portiolli eram os locutores-padrão, e isso influiu entre a mais rasteira rádio popularesca até pretensas "rádios rock" ambiciosas, como 89 FM (SP) e Rádio Cidade (RJ). Ou seja, até essas rádios adotavam, de maneira escancarada, o padrão de locução que a Jovem Pan FM lançava na época.
No mercado editorial, a Revista Jovem Pan também ditava padrões. A Jovem Pan também influiu na tentativa da Transamérica FM - hoje uma morta-viva em FM, uma "rádio de aluguel" para DJs e dirigentes esportivos controlada por um rico banqueiro - de requentar seu formato. E aí víamos as revistas JP, Transamérica e 89 praticamente com o mesmo conteúdo.
As vinhetas "espaciais" da Jovem Pan, ou seja, aquele fundo musical qualquer nota de um sintetizador em ritmo acelerado, que sempre era tocado quando os locutores anunciavam promoções e músicas, também viraram um padrão para o rádio como um todo, não sendo diferente nas ditas "rádios rock" acima citadas nem nas FMs que apostam no formato "AeMão" (jornalismo prolongado e esportes).
Durante muito tempo, Jovem Pan e Folha de São Paulo reinaram absolutas com tamanhos paradigmas, sem falar também de seus "fenômenos culturais". O meteórico sucesso dos Mamonas Assassinas foi lançado primeiramente na Jovem Pan, se propagou por tudo quanto é rádio pop, teve alta rotação nas rádios 89 e Cidade (a Rádio Cidade se comoveu mais com a tragédia dos Mamonas do que com a de Renato Russo, em 1996) e atingiu as mais isoladas rádios popularescas do interior do Brasil.
A gíria "balada", patenteada pela Jovem Pan, era difundida a partir do discurso coloquial difundido por Emílio Surita e Luciano Huck, este apresentador do Torpedo da Pan. Depois, Huck difundiu a gíria balada na Rede Globo, através do Caldeirão do Huck.
Muita gente mordeu a isca e caiu no ridículo falando a gíria "balada", relacionada à vida noturna, como se estivesse cuspindo na cara de alguém, sem perceber que "balada" era um eufemismo para o rodízio de pílulas de ecstasy (as tais "balas") nas boates dos jovens riquinhos de São Paulo.
As pessoas caíram a armadilha tentando transformar "balada" numa gíria universal e teve até "tribunal da Internet" defendendo essa gíria em 2007. No final, porém, a gíria virou jargão de fofoqueiros da TV e "sertanejos" cervejeiros e o verdadeiro sentido de "balada" pode ser identificado trocando, respectivamente, o "l" e o "d" da palavra pelo "b" e "c".
Na Folha de São Paulo, além de formatar o identitarismo cultural e a mentalidade política tucana, importando dos EUA as pautas culturais e políticas do Partido Democrata dos EUA, teve também o esforço de fazer domesticar as esquerdas e submetê-las ao neoliberalismo da direita moderada.
Primeiramente, no âmbito cultural, Pedro Alexandre Sanches saiu amigavelmente da Folha de São Paulo, depois de cumprir o trabalho do anti-esquerdista Projeto Folha, e foi passear pelas redações da mídia de esquerda para fazer proselitismo, ou seja, para fazer as editorias culturais de veículos como Carta Capital, Caros Amigos e Fórum pensarem conforme a linha editorial da Ilustrada. Sanches atuou como um freelancer não-assumido da FSP, exportando o pensamento de Frias na mídia progressista.
Com isso, as esquerdas começaram a ser sabotadas no setor cultural, passando a seguir a orientação brega-identitária da burguesia ilustrada que era o público-alvo da Folha de São Paulo. Depois as esquerdas foram politicamente cooptadas pelo tucanato clássico, a partir do "príncipe" Fernando Henrique Cardoso, o "guru" da FSP, que na prática fez do PT o "Partido dos Tucanos" enquanto o PSDB se converteu, a partir de 2018, num clube de "fascistas dente-de-leite".
Hoje as pessoas renegam o legado da Jovem Pan e da Folha de São Paulo, mas houve um tempo, entre os anos 1990 e 2000, que os dois veículos midiáticos reinavam absolutos na construção de uma mentalidade jornalística e cultural que atingia veículos concorrentes.
Por muito tempo os dois veículos sonhavam dominar o Brasil, e eram apoiadas por internautas que hoje fingem "sempre terem odiado" esses veículos, mas no fundo os agradecem por conta da imbecilização cultural que JP e FSP, em parte, participaram de forma bastante decisiva.
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