Vivemos uma grande catástrofe cultural no Brasil. Exagero? Claro que não. É verdade que temos um lado culturalmente saudável, mas ele está fora das bolhas sociais que mais aparecem na Internet e são mais influentes na produção do aparente bom senso predominante por aqui.
Se chegamos ao ponto de transformar uma gíria de burguesinhos paulistas associada a um consumo de drogas, a palavra "balada" (originalmente um eufemismo para um "rodízio de alucinógenos"), numa expressão pretensamente "universal e atemporal", então o cenário brasileiro é coisa de fazer tetraplégico mudo se desesperar e querer sair correndo pelas ruas gritando por socorro.
Acumulamos tanto os "novos normais" que, aos poucos, deterioraram culturalmente o nosso país nas últimas seis décadas que muita gente hoje se acostumou mal com esse culturalismo ao mesmo tempo conservador e vira-lata, servido como se fossem "valores naturais" de forma que aqueles que são mais antigos, como o culturalismo das eras Médici e Geisel, são os principais alvos de tendenciosas nostalgias que pegam desprevenida muita gente boa.
Uma matéria publicada no Último Segundo dá uma amostra dessa catástrofe cultural que assola o Brasil como uma areia movediça engolindo corpos frágeis. Ela descreve um estudo científico de chineses que vivem nos EUA e estudam no campus de Xangai, na Universidade de Nova York, a respeito da esquizofrenia.
Os pesquisadores do estudo, intitulado "Transformação motora-sensorial prejudicada mediante alucinações auditivas" (do original "Impaired motor-to-sensory transformation mediates auditory hallucinations"), podem ter descoberto o motivo que faz as pessoas portadoras de esquizofrenia "ouvirem vozes".
Quarenta participantes com esquizofrenia foram pesquisados e neles foram colocados monitores de encefalogramas. De acordo com o estudo, "distinguir a realidade das alucinações requer um eficiente monitoramento do indivíduo. Foi levantada a hipótese de que uma cópia dos sinais motores, denominada cópia de eferência (EC) ou descarga corolária (CD), suprime as respostas sensoriais; o comprometimento da função inibitória [habilidade de controlar impulsos] leva a alucinações".
Em outras palavras, a ausência de inibição de impulsos leva as pessoas a ter alucinações, e os pacientes com essa tendência não acionaram a "descarga corolária", mecanismo que silencia a voz interior do indivíduo para que a pessoa possa ouvir sons saindo de sua boca.
Segundo os autores da pesquisa, as pessoas que sofrem de alucinações tendem a "ouvir" vozes sem que haja estímulos externos. Os autores concluíram que "um novo estudo sugere que conexões funcionais prejudicadas entre os sistemas motor e auditivo no cérebro mediam a perda da capacidade de distinguir a fantasia da realidade".
UM SOFRE ALUCINAÇÕES E OUTROS CHORAM À TOA
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a esquizofrenia é um transtorno mental grave que atinge cerca de 23 milhões de pessoas em todo o mundo. Ela se carateriza por distorções de pensamento, percepção, emoções, linguagem, consciência de si mesmo e comportamento.
Aqui no Brasil um exame médico sério em torno da mente de um famoso "médium espírita", aquele mesmo que usava peruca e está associado a uma suposta caridade e à publicação de mais de 400 livros, apontou que sua "mediunidade" era na verdade uma alucinação mental que indica efeitos manifestos na esquizofrenia. O exame, feito em 1971, foi publicado na revista Realidade de novembro daquele ano, feita pelo renomado José Hamilton Ribeiro, repórter conhecido depois por sua atuação no Globo Rural.
Zé Hamilton também acabou desmascarando o "médium" de Minas Gerais, ao pedir para ele duas "psicografias", uma relacionada a uma mulher enferma mas ainda viva na ocasião, outra relacionada a um fictício homem. O "médium" produziu "psicografias" dessas duas pessoas. Quando a mulher faleceu, a pretensa "psicografia" já havia sido publicada bem antes.
O "médium" só tinha consciência quando se tratava de defender ideias medievais e ultraconservadoras, próprias de sua formação familiar e social. Mas a "mediunidade" que fez multidões chorarem copiosamente como que numa "masturbação pelos olhos", ou seja, a comoção humana transformada em mero divertimento, nunca passou de uma alucinação esquizofrênica.
É gravíssimo creditar como "comunicação com os mortos" essa alucinação, que fez um livro poético de 1932, com "parnaso" no título (numa época em que o Parnasianismo era uma tendência literária obsoleta, pois até o aparente neo-parnasiano Humberto de Campos, cujo nome foi depois usurpado pelo "médium", era influenciado pelo Modernismo), ser um livro pioneiro da literatura fake, com os créditos de inúmeros poetas e escritores com severas falhas quanto aos estilos supostamente expressos na obra.
Um aspecto muito estranho é que esse "glorioso" livro, do qual se observam créditos "espirituais" de Olavo Bilac, Castro Alves, Casimiro de Abreu, Augusto dos Anjos e até de Auta de Souza, sem que houvesse fidelidade real aos estilos originais dos respectivos autores, sofreu alterações editoriais por cinco anos, revelando a fraude, pois esperava-se que um livro "psicográfico" fosse uma obra "acabada" trazida por "espíritos benfeitores".
O "médium" era tratado como um mero fenômeno pitoresco, uma farsa produzida para provocar sensacionalismo e polêmicas baratas. Mas a ditadura militar, querendo combater a força oposicionista da Igreja Católica através da Teologia da Libertação, teria patrocinado o Espiritismo brasileiro, junto a instituições como Assembleia de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus e Igreja Internacional da Graça de Deus, para enfraquecer os católicos progressistas que denunciavam os crimes da repressão militar em organismos internacionais de direitos humanos.
E aí veio uma coisa catastrófica: o "médium" passou a ser promovido como uma pretensa unanimidade, cujo alcance assustador atingiu níveis preocupantes da Síndrome de Estocolmo, com segmentos sociais endeusando o referido "médium da peruca" sem saber que eram repudiados por ele: a comunidade LGBTQIA+, as esquerdas, o público roqueiro, mesmo ligado ao rock pesado, as atrizes associadas a alguma imagem de sensualidade.
Até ateus glorificam o "médium" (que reprovava o ateísmo, entendido por ele como "analfabetismo religioso"), fazendo com que comunidades como Ateísmo BR, nas redes sociais, atuassem como galinheiros endeusando uma raposa vista como pretenso símbolo de "dedicação ao próximo".
Torna-se uma grande catástrofe mental que faz com que a adoração ao "médium", cuja obra é marcada por ideias medievais fundamentadas pela Teologia do Sofrimento - que defende a desgraça humana como "caminho mais curto" para se "chegar a Deus" - , oculte aspectos sinistros como a morte suspeita do sobrinho Amauri Pena, em 1961, da qual o "médium" não se envolveu, mas acabou consentindo como um Pilatos "lavando as mãos" diante dessa provável "queima de arquivo", pois o sobrinho iria denunciar as fraudes do tio e do "movimento espírita".
Essa catástrofe faz com que nenhum jornalista investigativo, nenhum jurista e nenhum acadêmico se empenhem em pôr em xeque a reputação que o "médium" charlatão recebe de graça de seguidores deslumbrados capazes de se comover com filas gigantescas de pobres humilhados, esperado horas para receber donativos que se esgotam em dois dias, ou de famílias enganadas por mensagens de familiares mortos com os mesmos textos padronizados que começam com "Querida mamãezinha".
Ou seja, essa catástrofe mental de muitos brasileiros chega a níveis extremamente preocupantes, pois se um homem sofre de esquizofrenia, seus seguidores choram à toa em comoção tão fácil que muitos se atrevem a dispensar qualquer motivação lógica a respeito disso.
Isso faz com que os distúrbios mentais se contagiem e o resultado é que vemos um Brasil deteriorado social e culturalmente, fazendo com que se tornem distantes as chances do nosso país virar uma nação desenvolvida.
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