Aí o brega foi levado a sério demais e criou neuroses nos seus próprios defensores, que caíram em situações constrangedoras, sobretudo em blogueiras de esquerda que saíram defendendo Waldick Soriano e o pupilo José Augusto como se fossem "revolucionários", e criando "saias-justas" ao definir o sucesso "Xibom Bom Bom" do grupo de axé-music As Meninas como uma "tese marxista", e isso vindo de gente que, com certeza, nunca leu Karl Marx na vida.
Os defensores do brega querem idealizar em Waldick Soriano o simpático e alegre ativista de esquerda que combateu a ditadura militar e era perseguido pela censura. Visão extremamente falsa e paranoica, que fez até mesmo o lobby de Paulo César Araújo pedir para vetar na Internet vídeos de uma entrevista de TV em que Waldick defendia o machismo e a ditadura militar.
Essa paranoia ganha um sentido mais surreal quando se percebe que nem no punk rock existe essa neurose. Associado à rebelião juvenil, o punk nunca se esforçou em esconder de um de seus ícones, o falecido guitarrista dos Ramones, Johnny Ramone, o seu mais histérico reacionarismo, que poderia soar estranho para o contexto do punk e nem por isso ninguém se empenha em esconder.
No Rock Brasil, então, não dá para esconder que um dos maiores símbolos de rebeldia e atitude visceral, o roqueiro Lobão - inegavelmente um grande músico e artista, bom instrumentista e compositor, gravado até por João Gilberto - , é também um dos piores reacionários existentes no território nacional, antes amigo de Cazuza e hoje parceiro do medieval Olavo de Carvalho.
Mas o pessoal tem medo de ver Waldick Soriano como um reacionário, luta para vetar um vídeo que comprova tudo isso, e olha que Waldick faz sentido no contexto de sua música e comportamento, associado a um brega romântico, que já surgiu em função de um contexto social bastante conservador.
Em outras palavras: é mais estranho admitir que Johnny Ramone e Lobão são ícones do reacionarismo, e que Johnny morreu defendendo ninguém menos que George W. Bush. Mas ninguém tenta esconder isso. E pode-se gostar dos Ramones e de Lobão e, ao mesmo tempo, considerar esses dois figurões o supra-sumo do mais abominável reacionarismo ideológico.
No entanto, os que gostam de Waldick Soriano ficam com muito medo, até sem necessidade. Porque Waldick tem mesmo o perfil conservador. Como todo o brega, que, de fato, esteve bem no auge da ditadura militar e só era censurado porque os censores tinham também suas paranoias, não havia aquele maniqueísmo que fazia todo censurado parecer "revolucionário". Nem todos eram.
De todo o brega-popularesco, as pessoas podem gostar de suas músicas. É natural e democrático que se tolere seu gosto e até sua preferência. O que não se pode tolerar é uma visão fora da realidade e ver o brega conforme os preconceitos "positivos" da idealização da alta cultura.
O brega sucumbiu porque seus defensores sempre quiseram ver nele tudo aquilo que nunca foi nem é. Daí que o verdadeiro preconceito está em creditar ao brega caraterísticas que não lhe são adequadas, como o vanguardismo cultural e o esquerdismo político-ideológico.
O brega é comercial mesmo. É conservador até pelo seu aspecto retardatário de pegar carona em modismos ultrapassados (imagine Waldick cantando "dor-de-corno" quando isso havia saído de moda). O brega é o nosso hit-parade, e, queiram ou não queiram, ele sempre foi apoiado pelos barões da grande mídia.
Toda a linhagem do brega é reacionária, até quando tenta ser "provocativa", desde os antigos ídolos cafonas até os funqueiros. E se nem o punk esconde seus focos de reacionarismo, por que tem que se esconder o caráter reacionário do brega? Perder o preconceito não é aceitar tudo de bandeja, mas, antes de mais nada, compreender algo que realmente é, mesmo nos piores aspectos.
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