O que ocorreu na cultura rock? De repente, tem-se a impressão de que todos passaram a ter um pouco de emo ou poser, e mesmo aqueles que se inclinam a gostar de rock autêntico estão presos a clichês gestuais e comportamentais.
Tudo ficou em nome da "sonzeira", com pessoas fazendo sinal do demo com as mãos, botando língua para fora e fazendo air guitar. Isso quando não despejam gírias enjoadas como "galera", que hoje em dia nada tem a ver com rock e sim com Domingão do Faustão, da mesma forma que vemos na tutinha-luciano-huckiana "balada".
No momento, ao escrever este texto, ouço "1999" e "Feeling for You", do Cassius, dentro daquela onda de música eletrônica de DJ. Melhor do que ouvir "System of a Gugu-Down-Down" ("Sistema do Gugu-Dadá") ou "Queens of the Stom'ache" ("Rainhas da Dor de Estômago") e ficar que nem débil mental sacudindo a cabeça que nem naquele comercial dos postos Ipiranga.
Quando comecei a ouvir, na carona de um vizinho que sintonizava a Fluminense FM, vários clássicos do rock, eu me achava muito comportado para me inclinar à cultura rock. Via pessoas uns dois, quatro ou cinco anos mais velhas do que eu falando de rock e eu, com 12 anos em 1983, me achava careta demais para me especializar em cultura rock.
Hoje as coisas mudaram e, diante dessa cultura rock de carneirinho, capitaneada por duas rádios mauriçolas, a paulista 89 FM e a carioca Rádio Cidade, que trabalham uma linguagem que está mais para fãs do One Direction do que para qualquer rock autêntico, e por um Rock In Rio que trabalha uma imagem disneyficada do roqueiro, e eu fico me sentindo radical diante desse gado bovino.
Puxa, se festivais musicais ecléticos e "rádios rock" que mais parecem versões junkie da Rádio Disney comandam a cultura rock de tal forma que seus estereótipos ultrapassam as fronteiras e entram no terreno do rock autêntico, então eu prefiro ficar bastante cético com o rock.
No Brasil, aliás, a cultura rock está tão em baixa - isso quando não se admite que a cultura rock morreu no país - que essa onda de "rock" que se vê por aí mais parece um modismo ou uma tentativa de exumar um cadáver e fingir que ele está vivo.
Afinal, no mercado predomina o tal "sertanejo universitário" e sua profusão de duplas lançadas em quantidades industriais, todas iguais entre si, e o "funk carioca" que ruma para o "melody" para tentar agradar plateias mais abastadas, que soa estranho ver uma meia-dúzia de incautos confiantes de que o rock está em alta, bastando fazer os gestos estereotipados necessários.
Tudo virou espetáculo, mercadoria e, de repente, o rock perdeu aquela rebeldia. Até os roqueiros mais "radicais" vão para o That Metal Show do VH-1 mais parecendo astros pop. Cadê a música, a rebeldia, a postura artística e comportamental que o rock teve sobretudo entre 1963 e 1992?
O que eu observo é que, salvo honrosas exceções, perdeu-se aquela visceralidade do rock. Perdeu-se sangue, coração, cérebro, neurônios. e o que sobrou é apenas uma linha de montagem que combina arremedos de rebeldia, agressividade sonora e outros clichês, mesmo quando haja aparentes boas intenções nisso.
Fico comparando essa falta de visceralidade, essa falta de espírito orgânico no rock, com os "roqueiros" dos seriados do Disney Channel. Como confrontar o Jonas Brothers com roqueiros "bem intencionados" mas que têm a mesma falta de sangue, coração, cérebro e neurônios?
Os mais jovens se deslumbram. Os que ouvem a 89 e a Cidade, então, que conhecem muito pouco de rock e não sabem a diferença sonora entre uma guitarra distorcida, uma britadeira de rua e uma furadeira elétrica, o comportamento bovino torna-se ainda mais acentuado.
Agora que vem o tal Rock In Rio, espécie de Disneylândia roqueira, pretendo me afastar um pouco desse arremedo circense de "cultura rock", essa carnavalização do gênero que ganha a adesão de gente que normalmente não está aí para o gênero. Como no tal Dia Mundial do Rock que o mundo não comemora. Acho que vou me concentrar mais na música eletrônica.
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