Perdemos hoje o grande mestre Luiz Carlos Maciel, com quem tive o prazer de, em 2001, entrevistar via e-mail.
Tardiamente soube que poderia ter ido a uma de suas últimas palestras, em abril de 2009.
Mas o contato por e-mail foi bastante modesto.
Minha pauta de entrevistas não refletia a riqueza de sua trajetória e fiz algumas perguntas básicas, introdutórias.
A entrevista era para o portal Rocknet, de Luiz Antônio Mello e da equipe da ACTECH, no qual eu tive uma coluna, "Pelos Porões do Rock".
Era como se eu fizesse um "Luiz Carlos Maciel para principiantes".
Mesmo assim, saiu legal e a entrevista eu publiquei no meu livro PELAS ENTRANHAS DA CULTURA ROCK, de 2014.
Maciel havia sido, até hoje, um dos remanescentes de uma geração muito boa de intelectuais e jornalistas.
Conviveu com jornalistas diversos, era de uma geração que teve Sérgio Porto, Millôr Fernandes, Glauber Rocha, ou mesmo Paulo Francis, um tanto reacionário mas de inteligência admirável.
É uma pena essa indiferença toda com Maciel, porque ele poderia ter encerrado a vida em atividade, mas morreu doente e enfrentando sérios problemas financeiros.
Era um grande homem de teatro, da imprensa, participou do Pasquim, comandou a versão brasileira da Rolling Stone, esteve no Jornal de Vanguarda, da TV Excelsior.
Ele chegou a ser preso na ditadura militar, num processo que hoje, em versão compacta, se observa com as conduções coercitivas de suspeitos da Operação Lava Jato.
Era também um profundo conhecedor da cultura underground dos anos 1960 e sabia como ninguém explicar a psicodelia e a cultura hippie para as gerações mais recentes.
Li vários livros dele e viajava naqueles tempos saudosos de 1967-1970, mas que seriam muito complicados de serem reconstituídos hoje.
Até porque mil dilemas e mil complexidades tiraram o glamour daquela época.
Hoje a provocatividade virou mercadoria, dentro de uma juventude sem idealismo que parece ver a vida como um grande supermercado.
Ver que "alternativo", no Brasil de hoje, é Raça Negra, É O Tchan, Mamonas Assassinas, Art Popular e todo o "funk" é de causar repugnância.
Da mesma forma que dá enjoos saber que os canastrões Chitãozinho & Xororó viraram "cult" com "Evidências", música "deles" que na verdade é composição do bregalhão José Augusto.
Em outros tempos, isso não era assim.
Maciel andava cético com o rock até que conheceu a música de Jimi Hendrix, que seria hoje um senhor idoso de 75 anos, quatro a menos que o jornalista.
Hendrix partiu muito antes, mas teve apetite muito grande para fazer um som transformador e instigante, coisa que está em falta hoje em dia.
Pena que os "heróis" da juventude de hoje são tão rasteiros e simplórios.
Ídolos musicais comerciais, astros de reality shows, veteranos do brega-popularesco, subcelebridades do futebol, tudo isso é que faz a cabeça dos jovens.
Leitura? Só se for a de diários de ídolos teen ou obras de youtubers. Quase tudo sem a profundidade que se via nas obras de Luiz Carlos Maciel carregadas de muita informação.
Maciel não gostava dos anos 80, mas eu respeitava esse ponto de vista. Afinal, ele conheceu os anos 60, bem mais revolucionários e transformadores.
Ele viveu aquela época e tentou o possível para mostrá-la às "crianças", como ele apelidava as pessoas mais jovens.
Maciel não teve a saúde suficiente para permitir uma atuação mais plena em nossos dias, assim como o obstáculo da indiferença que se tem hoje aos grandes mestres também o prejudicou.
Que canal do YouTube Maciel poderia ter feito atualmente, mostrando muitas ideias e arejando as mentes da moçada!
Um sujeito como esse poderia até ter sido mais influente, mesmo que as atuais gerações às vezes discordassem com seus pontos de vista.
Maciel poderia ter causado polêmica, mas uma polêmica "do alto", com debates de ideias, e não a polêmica "de baixo" que se vê nos ídolos midiáticos de hoje.
Pena que ele se foi. Mas pude eu ter o breve contato, ainda que por e-mail.
Um de seus últimos trabalhos foi O poder do clímax — Fundamentos do roteiro de cinema e TV, de 2003.
Fica aqui a solidariedade aos familiares de Maciel por essa perda triste, e à cultura brasileira, que perdeu um de seus melhores intelectuais.
E fica também minha gratidão ao próprio Maciel.
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