
A burguesia ilustrada é a elite que apoia Lula e isso parece impossível diante das narrativas oficiais, que associam o presidente ao antigo vínculo com as classes pobres. Mas a queda de popularidade de Lula, que escapa dos paradigmas do “pobre de direita”, nos faz pensar sobre de que lado o petista passou a estar nos últimos três anos.
Lula tornou-se a saída de emergência para a elite do atraso, que com sua ganância sem freios se viu no risco de botar seu conservadorismo a perder. Os descendentes de bandeirantes genocidas, de senhores de engenho escravistas e de oligarquias fraudulentas e golpistas tiveram que tirar os anéis para salvar seus dedos.
Com Bolsonaro e a Covid-19, a burguesia ilustrada se viu no risco do feitiço virar contra o feiticeiro. Como vimos antes, a burguesia de chinelos viu que foi longe demais com Bolsonaro e, por isso, nossas elites do privilégio precisam se disfarçar de gente simples, se convertendo numa classe heterodoxa, fantasiada de gente simples.
Daí que vemos que a fórmula do golpe militar de 1964 passou a se tornar um bumerangue que voa na direção dos netos dos antigos golpistas que derrubaram João Goulart. Depois do AI-5 e do "milagre brasileiro", os netos da burguesia precisaram abrir mão do luxo aparente e ostensivo, e precisam parecer "simples" e "legais", vendo que agora os efeitos do golpismo se voltam contra a própria burguesia.
Por isso, a burguesia ilustrada de hoje precisa se separar simbolicamente da burguesia ortodoxa, que se torna a única culpada pelos retrocessos sociais do Brasil. A "nova" burguesia precisa manter o poder de seus antepassados e, por ironia, precisa se livrar da aparência para manter a essência de seus privilégios e seu domínio.
Dessa forma, hoje os netos da geração que fez o golpe de 1964 tentam renegar novos golpes, não porque viraram o suprassumo do humanismo, mas porque, para sobreviver, precisavam mudar seus métodos. Por sorte, o "poder suave" (soft power) substituiu a antiga coerção e hoje, com os segmentos sociais antes "subversivos" (proletários, camponeses, roqueiros, jovens e pobres em geral) ficaram domesticados e inofensivos, até dá gosto para o neoliberal tirar onda de esquerdista.
Por isso os netos dos que não suportavam um segundo de João Goulart no poder querem, agora, reeleger Lula e torcer para que essa reeleição seja consumada de vez, agora que o petista não assusta mais a alta sociedade e até dá dinheiro para os coletivos culturais da aristocracia artsy descolada.
A burguesia ilustrada continua gananciosa, egoísta, meritocrática e autoritária na sua essência. Apenas mudou o modo de expressar essas qualidades. Antes que o bumerangue de 1964 atinja suas cabeças.
Comentários
Postar um comentário