A Folha de São Paulo não conseguiu esconder que o "funk" rivalizava com a fala de João Pedro Stedile, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).
A famosa organização, "criminalizada" pela mídia hegemônica, foi uma das organizações que montou acampamento nos últimos dias, em Porto Alegre, para acompanhar o julgamento do ex-presidente Lula no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o TRF-4.
Um grupo munido de vozes, tambores e passinhos, como no manifesto na sede da Rede Globo de Televisão, pegava as bandeiras do MST e cantarolava adaptando um sucesso de "funk".
Se ainda fosse o megahit "Que Tiro Foi Esse?", da Jojo Toddynho, a atitude seria compreensível.
Mas se trata de "Oh, Novinha", um sucesso mais privativo do meio, do MC Don Juan.
A letra original foi adaptada para o contexto da manifestação.
O trecho original diz: Oh, novinha, eu quero te ver contente, não abandona o 'peru' da gente".
Na manifestação ele virou: "Oh, trabalhador, eu quero te ver contente, vem defender a democracia com a gente".
O "funk" aproveita o gancho de que a juventude atual recebeu uma educação hipermidiatizada e hipermecantilizada.
É uma geração que, culturalmente, absorve facilmente os valores do consumismo neoliberal das corporações estadunidenses.
Não sabe a diferença entre música comercial e não-comercial, e, mesmo assumindo posturas de esquerda, são "educadas" culturalmente por gente do nível de Luciano Huck.
É um pessoal apegado às mídias sociais, ao consumismo pleno, e mal está conhecendo o outro Brasil, um culturalismo sombrio trazido pelos livros do sociólogo Jessé Souza.
Esse culturalismo ainda virá à tona nos debates públicos, quando se tornar comum o fenômeno do "pobre de direita", assim como veio o fenômeno do "roqueiro de direita" ou do "jovem de direita" em geral.
Até lá, porém, os jovens ainda acreditam que o "popular demais" é "mais divertido" que o Rock Brasil e, principalmente, a "velha" MPB.
Mas só porque é "mais divertido" e "desce redondo" não significa que nomes como Marília Mendonça, Jojo Toddynho, Pablo Vittar, MC Diguinho, MC Kevinho, MC Don Juan e o que vier sejam artistica e culturalmente relevantes ou substanciais.
Muito pelo contrário. Os sucessos são mais como jingles, com frases de efeito imediatas, que conquistam o público porque, infelizmente, ele se "educou" publicitariamente.
Mesmo os esquerdistas assimilaram valores de Luciano Huck, da Jovem Pan, de Nizan Guanaes ou mesmo do ancião Fernando Henrique Cardoso, através da intelectualidade "bacana".
E aí o "funk" virou o Cabo Anselmo da vez. Vide o "baile funk" supostamente solidário a Dilma Rousseff no dia 17 de abril de 2016.
Naquela época o "funk" rivalizava com as manifestações contra a abertura do processo de impeachment que iniciou o caminho da expulsão da presidenta do cargo.
Apesar da atitude "solidária" de Rômulo Costa, descobrimos que, menos de meio ano antes de sua atitude "em apoio a Dilma", ele havia comparecido a um evento de lançamento do livro de um ex-jornalista da Globo.
O jornalista em questão, Luís Erlanger, depois foi atuar nos bastidores da Comunicação do governo Michel Temer.
O "rei do funk" e dono da Furacão 2000 foi ao lançamento do livro No Fio da Navalha onde também estavam presentes Luciano Huck e João Roberto Marinho, um dos irmãos donos das Organizações Globo.
Não é o primeiro evento em que Rômulo Costa aparece para cumprimentar Erlanger. Outro livro dele, Antes Que Eu Morra, também foi prestigiado pelo dono da Furacão 2000, que foi fotografado na ocasião ao lado do jornalista.
Huck e Rômulo Costa também tiveram muitos eventos em comum.
Aliás, o próprio Rômulo Costa elegeu Huck como "embaixador do funk" entre 2000 e 2009.
Nessa época o "funk" trabalhava seu crescimento midiático e, entre 2003 e 2005, foi divulgado de maneira estranhamente frenética em tudo quanto era atração e veículo das Organizações Globo.
Até o Casseta & Planeta, já no começo de sua "tucanização", criou personagens funqueiros, MC Ferrow e MC Deu Mal, que tornou-se propaganda de divulgação dos ídolos do "funk".
O "funk" tornou-se, para os jovens, uma espécie de "Cavalo de Troia" do Brasil. Ou talvez uma "Eguinha Pocotó de Troia".
Assim como uma religião "espiritualista" que eu abandonei, que se conhece aqui como Espiritismo, está para os mais velhos.
São fenômenos que "descem macio" nas forças esquerdistas não porque são solidárias às causas progressistas.
Mas porque funqueiros e espiritualistas adotam um discurso não-rancoroso e se promovem às custas de imagens de pessoas pobres e negras sorrindo, e de um discurso falsamente progressista, seja o de "expressão das periferias" ou "coração do mundo".
Apoiando tais fenômenos, as esquerdas se esquecem que eles são blindados pela Rede Globo. O lúcido Leonel Brizola recomendava: se a Globo apoiava, devíamos rejeitar.
Só que não.
Tem espiritualista famosíssimo homenageando e cumprimentando João Dória Jr. e ainda há colunista de esquerda defendendo esse dito "médium", entusiasta do embuste de "crianças-índigo" que não passa de armação esotérica de mercenários como Nancy Ann Tappe, Lee Carroll e Jan Tober.
Os mais velhos caem no conto desses religiosos, em nome do apelo fotográfico de meninos negros e pobres sorridentes.
Os mais jovens caem no conto dos funqueiros, em nome do apelo televisivo de jovens negros e pobres sorrindo e dançando.
CABO ANSELMO EM 1964 E ATUALMENTE.
Os espiritualistas, em 1964, foram para a Marcha da Família Unida com Deus pela Liberdade pedir a ditadura militar.
O "funk" de hoje tem um apelo literalmente similar ao de um grupo de fuzileiros navais comandado por Cabo Anselmo - codinome do sargento José Anselmo dos Santos - , que eram ovacionados pelas esquerdas.
"Herói" das esquerdas, Cabo Anselmo revelou-se depois um reacionário colaborador da CIA.
O "funk" já tem comprovada sua ligação com a CIA, pois seus apoiadores assumiram serem financiados por instituições ligadas ao órgão do governo dos EUA, a Fundação Ford e a Soros Management Fund.
Além do mais, não faz sentido "guevarizar" um ritmo que surgiu sob inspiração do miami bass surgido nos redutos anti-castristas da Flórida, no extremo Sul dos EUA.
A narrativa que evoca um ufanismo das favelas, locais de construções precárias e muita miséria, e o uso de um jargão de FHC, "periferia", na sua concepção ideológica, parece bonita e virou, oficialmente, uma pretensa unanimidade.
Mas isso esconde a apologia à pobreza e à ignorância, sem falar que todo o discurso em defesa do "funk" acaba, depois, fortalecendo ainda mais as réplicas direitistas.
Esse é o perigo. E as esquerdas estão felizes com o "funk", o que pode colocar em risco o esquerdismo político, com esse vínculo tão tendencioso quanto falso.
A cada vez mais o "funk" se consolida como o "Cabo Anselmo" da vez, tentando fazer barulho para abafar e ofuscar, a pretexto de "reforçar", o discurso dos movimentos sociais.
O que a gente não imagina que rolou de papo entre Rômulo Costa e Luís Erlanger.
O empresário-DJ que se dizia "amigo da Dilma" e o jornalista que contribuiu para "positivar a imagem" do governo Michel Temer.
E quantas parcerias históricas da Furacão 2000 com a Som Livre, braço fonográfico da Globo.
Dá pena os jovens fazerem protesto contra a Rede Globo usando a "prata da casa".
Só que se manifestar contra o inimigo usando a arma deste pode dar em tiro pela culatra.
O "funk" pode dar o "beijo da morte" para o ciclo do PT. Com as bênçãos do chamado "Espiritismo à brasileira".
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