LOCUTORES MAURICINHOS, SEM VIVÊNCIA COM ROCK, DOMINAVAM A PROGRAMAÇÃO DAS DITAS "RÁDIOS ROCK" A PARTIR DOS ANOS 1990.
Como o público jovem foi enganado durante três décadas e meia. A onda das “rádios rock” lançada no fim dos anos 1980 e fortalecida nos anos 1990 e 2000, não passou de um grande blefe, de uma grande conversa para búfalos e cavalos doidos dormirem.
O que se vendeu durante muito tempo como “rádios rock” não passavam de rádios pop comuns e convencionais, que apenas selecionavam o que havia de rock nas paradas de sucesso e jogavam na programação diária. O estilo de locução, a linguagem e a mentalidade eram iguaizinhos a qualquer rádio que tocasse o mais tolo pop adolescente e o mais gosmento pop dançante. Só mudava o som que era tocado.
Não adiantava boa parte dos locutores pop que atuavam nas “rádios rock” ficarem presos aos textos, como era inútil eles terem uma boa pronúncia de inglês. O ranço pop era notório e eles continuavam anunciando bandas como Pearl Jam e AC/DC cono se fossem o Double You e os Backstreet Boys.
E a falta de conhecimento de causa dos locutores não era compensado pela boa pronúncia de inglês, pois eles não sabiam muitas vezes de que banda se tratava. Os locutores não sabiam a diferença entre Bad Company e Bad Religion, por exemplo, diga-se de passagem.
Quando não havia o contraponto da Internet, gerentes artísticos (nome formal dado aos coordenadores de programação das rádios) enganavam o público com sua sinceridade de porta-vozes de empresas, ao definir as tais “rádios rock” como “diferenciadas”.
Na falta de uma qualidade relevante, o marketing dessas rádios se alimentava mais do que elas evitavam tocar do que elas proponham a tocar, pois o rock que elas tocavam era tão previsível que nem precisava ouvir essas rádios para saber o que elas estavam tocando. Basta consultar as paradas de sucessos publicadas em revistas e jornais da época.
Somente em poucos horários específicos havia programas com alguma relevância, e mesmo assim no fim de noite, além do tapa-buracos de madrugada, que era apenas um horário mais flexível mas não muito criativo. E os programas específicos de fim de noite, feitos por músicos e jornalistas especializados, eram apenas duas horas diárias das 24 que não faziam muita diferença.
Muita gente foi enganada. Muitos acreditavam que era a oitava maravilha do mundo qualquer rádio se autoproclamar “rock”, Qualquer “loucutor” poperó de uma “rádio rock” podia odiar o gênero na sua vida pessoal, mas tinha seus quinze minutos de fama para passar ao público a imagem de um personagem “roqueiro”.
E o pior é que essas “rádios rock” apelavam para o mau gosto das vinhetas, com aquele clichê do cara que pronuncia a palavra “rock” como se estivesse arrotando. Tudo para forçar a barra de um segmento que não era trabalhado com competência e estilo.
As programações eram um horror. O repertório musical era previamente montado pelas gravadoras. Quando muito, apenas as bandas de rock locais eram um relativo diferencial, mas mesmo assim era em função do que estava na moda. A moda podia ser imitar a Legião Urbana, ou ser uma mistura de grunge com poppy punk ou botar humor como os Mamonas Assassinas ou investir numa “rebeldia pragmática” de Raimundos e Charlie Brown Jr .
Nos acostumamos mal com essas rádios de tal forma que nunca mais a trajetória brilhante da Fluminense FM irradiou no rádio do Rio de Janeiro, por exemplo. Até hoje a Fluminense tornou-se reconhecida pelo fato de ter não apenas impulsionado a renovação do Rock Brasil, mas ter sido uma das poucas a sair da zona de conforto dos hits. Tocava até Gente Giant, Teardrop Explodes e XTC na programação normal.
Até agora nunca os fluminenses e cariocas tiveram uma rádio de rock autêntica e de qualidade, tendo que se contentar com limitações diversas. As rádios que tentaram preencher as lacunas da Flu tinham problema de sintonia, não pegavam no Grande Rio ou em Niterói ou não podiam ser sintonizadas na rua sem que haja algum problema de sinal.
Já as rádios que sobraram, no Grande Rio, com o rótulo de “rock”, eram apenas rádios pop com vitrolão roqueiro, que nem sequer o básico da cultura rock ofereciam para os ouvintes. A Rádio Cidade e, durante um tempo, a Transamérica (esta propriedade de um grande grupo financeiro dono de uma rede de hotéis), tiveram uma performance vexaminosa no segmento rock que nem de longe fizeram os roqueiros se resignar com o fim da antiga Maldita.
Aliás, lembrando que, poucos dias atrás, o grande ícone do heavy metal Ozzy Osbourne faleceu, duas semanas após uma honrada despedida do Black Sabbath, no estádio de sua terra natal, Birmingham, na Grã-Bretanha, nota-se a falta de respeito que as "rádios rock" dão a esses nomes, rebaixando o icônico vocalista - cujo óbito contou com as vibrações de amor e solidariedade que nenhum "espírita" sequer pensa em manifestar - a um one-hit wonder pela Rádio Cidade, que só tocava "Perry Mason", por sinal só porque a música tinha clipe rolando na MTV.
Mas o pior é a blindagem que as ditas “rádios rock” reveberam, principalmente nos anos 2000. Uma juventude arrogante e irritada, que só ouvia Linkin Park “das antigas”, Charlie Brown Jr. e Guns N’Roses que se achava “dona” da cultura rock do planeta. Essa juventude não aguentava críticas à 89 FM e à Rádio Cidade e rebatiam com ataques e ofensas.
Sobretudo na Rádio Cidade, essa patota mais preocupada com lutas de MMA, jogos RPG, humorísticos e futebol se achava no juízo de valor de ser a única a determinar o que deve ou o que não deve valer na cultura rock do mundo. Gente que mal tirou as fraldas e se achava no direito de dar ordens até em roqueiros falecidos como Jimi Hendrix.
Isso só agravou a reputação das “rádios rock” do Brasil e demonstrou o quanto elas eram farsantes até na formação de um público arrogante, metido e totalmente pedante e desrespeitoso, capaz de esculhambar bandas como Who e Led Zeppelin e a investir em burrices como atribuir diferentes pessoas entre o baterista do Nirvana e o vocalista e guitarrista do Foo Fighters, que sabemos ser o mesmo Dave Grohl.
Agora, com o desgaste das rádios comerciais ditas “de rock”, elas tentam uma última cartada no revival do Rock Brasil dos anos 1980, num país em que “tudo é anos 80”, até calhambeque dos anos 1920. Quem viveu a onda Ploc 80 há vinte anos sabe disso, qualquer nostalgia era “anos 80”, até a torta da vovó.
Aí tem muita banda de rock dos anos 1990, que originalmente renegava o legado da década anterior, embarcando agora na nostalgia do Rock Brasil 80. Mas aí vemos o caráter bem superficial desse saudosismo que só aproveita a parcela hitmaker dessa tendência.
E aí concluímos o embuste que foram essas “rádios rock” que não passam das mesmas rádios pop de sempre querendo oferecer um conteúdo “diferente”. Mas é tudo farofa do mesmo prato, vide a Faria Lima que une Jovem Pan e 89 FM e a geração de DJs sarados cariocas que nos anos 1990 se dividiram entre botar dance music na antiga Flu FM e transformar a Rádio Cidade em pretensa rádio de rock. Todo mundo é a mesma gangue, ninguém naturalmente engajado na causa do verdadeiro rock.
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