As forças progressistas ainda precisam conhecer o que é cultura.
Os erros que os movimentos de esquerda fizeram, em adotar a mesma agenda de abordagens culturais da centro-direita, deixou-os em situação bastante ridícula.
Em muitos aspectos, defender a bregalização cultural contribuiu para a queda de Dilma Rousseff.
Deixou-se o povo pobre brincando no entretenimento brega, sob os aplausos até de antropólogos e cineastas, e perdeu-se o apoio necessário para tentar salvar o governo de Dilma.
Mas aí a direita anabolizou jovens reacionários com o discurso pseudo-libertário dos "coxinhas" que abriram caminho para os retrocessos sociais de hoje.
A intelectualidade "bacana" achava que o ideal brega da "pobreza feliz" era o máximo, vendo progressismo até no subemprego dos camelôs, e abriu caminho para a reforma trabalhista que deu umas mordidas fatais na CLT.
A intelectualidade "mais legal do país" criou um "monstro": sonhou com um Brasil brega virando potência emergente e acordou com o Brasil temeroso em acelerada marcha-a-ré.
Pudera. O brega é a cultura do colonialismo, do pobre ao mesmo tempo resignado e envergonhado consigo mesmo e sonhando com valores elitistas e estrangeiros.
Uma cultura confusa que apenas mistura dois extremos, o provincianismo e o colonialismo cultural, no abismo da confusão mental que as oligarquias sempre impuseram aos pobres.
As esquerdas morderam a isca da "provocatividade" e da apologia ao "mau gosto" e acharam que a vanguarda cultural estava aí e isso garantiria o progresso das classes populares.
Só que os barões da grande mídia, que sempre patrocinaram o brega-popularesco, marcaram ponto nesse gol contra das esquerdas.
Hoje está um clima de baixo astral cultural.
A breguice toda foi comemorar suas conquistas nos palcos da mídia hegemônica, até nos braços de Luciano Huck, Danilo Gentili e dos atores mais "coxinhas" da Globo.
E agora temos a "provocatividade" que virou mainstream, com Pablo Vittar, Silvero Pereira e similares.
A mídia venal, que costuma celebrar hoje o elenco de "provocadores" que o portal Farofafá publica na véspera, já se antecipou a este.
O cantor drag Pablo Vittar não precisou ser "guevarizado" e começou seu sucesso direto no establishment midiático.
A "provocatividade" de formas espetacularizadas de movimentos LGBT, curvy, feminista etc acontece até em festivais de "sertanejo" como o de Barretos (SP), patrocinado pelos políticos do PSDB.
Vive-se a onda da "provocatividade", em que a música brasileira é apenas uma pálida trilha sonora de um comportamento ao mesmo tempo narcisista e estereotipado.
Criou-se uma "contracultura de resultados", um "tropicalismo de resultados", uma música que só existe como fundo de uma atitude "zangada" ou "narcisa".
É a feminista com o discurso de que "homem não presta", ou de que achar o máximo se embriagar e fumar cigarro, que, não raro, acaba compactuando acidentalmente com o machismo.
Vide o caso das mulheres-objetos que, durante muitos anos, foram sinônimo de um pretenso feminismo.
No entanto, elas apenas eram o falso maniqueísmo entre duas imagens machistas da mulher: a da mulher recatada e a da mulher reduzida a um brinquedo sexual.
É um estranho feminismo no qual as mulheres em geral não querem muita coisa senão o "direito à embriaguez", mesmo que seja para enriquecer um machão como Jorge Paulo Lemann.
E para aquecer um mercado marcado de comerciais com mulheres-objeto "desejadas".
Nesse contexto, a mídia venal também explora de maneira pejorativa a imagem da mulher solteira, reduzida a uma hedonista compulsiva.
Uma funqueira que é uma das últimas a personificar esse estereótipo, e que nem cara de solteira tem, lançou uma música na qual afirma que "está solteira de novo".
Ela deu umas duas ou três entrevistas enfatizando sua condição de "solteira".
Alguém levaria a sério uma coisa dessas? Uma solteira de verdade não ficaria perdendo o tempo dizendo "olha, pessoal, eu estou solteira, viu?".
Gostando ou não da vida de solteira, a solteira autêntica se preocuparia com outras coisas.
Ela falaria de História, Política, Artes, escreveria poesia, faria programa de turismo, mostraria outras coisas interessantes.
Só na imbecilização cultural brasileira é que a "solteira" só tem uma preocupação na vida: a vida de solteira, na qual estabelece uma relação confusa e contraditória.
Num dia, se declara "solteira e feliz". Noutra fala que está "à procura de um príncipe encantado". Se o "príncipe" aparece, ela rejeita e diz "ele é tudo de bom, mas somos só amigos".
Ou, em certos casos, rejeita porque ele "não presta".
A pretensa "solteira" diz num dia que os homens "fogem de medo dela". Em outro, diz que os homens "são uma porcaria". No terceiro, diz que eles são "carentes".
É por isso que existe o estado civil "enrolada".
E, em muitos casos, as "solteiras" não passam de umas senhoras comprometidas que, por razões contratuais, "desfazem" seus casamentos felizes para poder vender suas imagens de "desejáveis".
A condição de casadas, sabe-se, compromete o produto "sensualidade", frustrando os fãs.
Nessa "cultura" hipermidiatizada, hipermercantilizada e hipersexualizada, a "provocatividade", assim como o "mau gosto", não é subversiva.
Criou-se muita "revolução cubana" em copo d'água, sem efeitos reais para uma sociedade mais progressista.
Que podemos ter diversão, provocação, senso de humor, sensualidade numa cultura autêntica, isso é indiscutível.
Mas não dessa forma ao mesmo tempo forçada e caricatural que se tem no imaginário brega.
É essa forma que acaba mais alimentando o establishment midiático do que favorecendo os movimentos sociais.
A provocatividade virou "sistema", sem que tivesse provocado uma revolução sequer na sociedade.
Os barões da grande mídia agradecem pelas esquerdas médias, ouvindo o canto de sereia dos intelectuais "alienígenas", por aceitarem a bregalização cultural.
Acabaram abrindo o caminho para o governo Michel Temer, ele mesmo tão canastrão e com pinta de ídolo brega.
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