A reforma trabalhista proposta pelo presidente Michel Temer é prejudicial às classes trabalhadoras.
Afinal, ela favorece os interesses dos patrões, em detrimento dos empregados.
Mas isso não impede que parte dos trabalhadores passe a apoiar a medida.
Afinal, a campanha midiática dará a impressão de que, flexibilizando as relações de trabalho e extinguindo encargos, facilitará a oferta de emprego.
O problema é que os pobres podem aderir a essa armadilha com gosto.
Primeiro, porque os salários podem ser reduzidos, devido ao fim dos encargos ou mesmo pela redução propriamente dita.
Segundo, pela precária formação educacional e pela vulnerabilidade do povo pobre ser persuadido pela mídia hegemônica.
O pobre é bombardeado pelos jornais "populares", pelos programas policialescos de TV e pelo Jornal Nacional.
Em vários estabelecimentos comerciais, têm em mãos as reacionárias revistas Veja, Isto É e Época.
Nas ruas do Grande Rio, é fácil ver pobres fazendo comentários contra os movimentos sociais, os partidos de esquerda e as causas trabalhistas.
É o "pobre de direita", um fenômeno que sempre existiu mas que tende a crescer.
Será o novo problema na pauta das forças progressistas.
Tempos atrás, o "jovem de direita" foi um fenômeno que, também não sendo inédito, mesmo assim pegou muita gente de surpresa.
"Roqueiros" de hit-parade, cyberbullies e outros reaças "irados", "perseguindo" quem contesta modismos políticos ou midiáticos, ainda eram vistos como "progressistas" por muita gente, até por boa-fé.
Ainda era o tempo em que Lula só começava a ser massacrado pela mídia hegemônica, mas tinha um carisma enorme.
Os "coxinhas" de 2005-2007, ainda do tempo do Orkut, se autoproclamavam "de esquerda".
Havia algumas razões para isso.
Não podiam hostilizar Lula, ainda um ídolo entre jovens.
Tinham que conquistar a confiança de amigos esquerdistas, petistas ou não.
E o esquerdismo ainda era visto como um "protocolo" da juventude, por causa dos paradigmas de modernidade e rebeldia.
Só em 2010 passaram a se tornar reacionários, pois a essa altura atraíram para si o apoio de mais pessoas nas mídias sociais.
O "pobre de direita" será a nova onda da vez.
E o novo contexto de mercado de trabalho, mais irregular, também favorecerá a corrupção.
Os salários serão desvalorizados, mas, em compensação, haverá situações em que se ganhará mais "por fora".
Muitos empregados, para se manterem no emprego, se tornarão cada vez mais subordinados.
O mercado de trabalho virará uma selva, porque, com o trabalho mais instável, ninguém vai querer estar na fila das demissões.
Haverá todo um malabarismo para agradar os patrões e, pelo menos, ficar mais tempo no emprego.
Com isso, haverá mais assédio moral, mais disputas vorazes, para não dizer violência.
E, desta forma, os pobres que arrumam emprego vão fazer o máximo possível para ficar ao lado dos patrões.
E vai que os patrões decidam fazer campanha para tirar Lula da corrida de 2018, por exemplo.
Aí os "pobres de direita" entrarão, pagos pelos patrões para fazer difamação nas mídias sociais.
Bepe Damasco escreveu um artigo, preocupado com o reacionarismo crescente entre os pobres.
Meu irmão Marcelo viu, num ônibus da linha 35, em Niterói, um negro pobre defendendo Jair Bolsonaro e outros passageiros, também pobres, lhe dando apoio.
Evidentemente, isso trará também novas questões que as forças progressistas e a sociedade em geral não conseguem sequer cogitar.
O "funk", por exemplo. As esquerdas se comportam como o "marido corno-manso" ao cortejar o "funk", que as trai constantemente e sempre comemora suas vitórias nos palcos da mídia hegemônica.
O "funk" é apoiado por Alexandre Frota, Danilo Gentili, pelos atores globais que protestaram contra Dilma Rousseff, por reaças doentes como Marcelo Madureira e Lobão.
Mas as esquerdas, na sua boa-fé, sempre acreditaram no "funk" por causa da imagem alegre do povo pobre.
Uma religião tida como "espiritualista", que começa a ter suas irregularidades denunciadas na Internet, também é blindada pela suposta caridade que a faz associar à imagem positiva do povo pobre.
Evidentemente, muitas coisas foram descobertas de 2002 para cá, e, olhando para trás, até parte da imprensa hegemônica era "santificada".
Tanto o "funk" quanto a tal religião (que abandonei há cinco anos) podem estar adotando uma abordagem paternalista do povo pobre e influenciá-los de forma não tão positiva quanto se imagina.
Assim como a mídia venal, estas instituições também podem produzir o "pobre de direita".
O pobre amestrado pela religião, ou pela tirania mercadológica do "funk", que poucos admitem ser um ritmo hipermercadológico e hipermidiático.
A pobreza no "funk" pedia mais consumismo que qualidade de vida, praticamente deixando os pobres presos nos padrões simbólicos da vida degradada em que viveram.
O "funk" só quer que os pobres tenham mais grana, mas que continuem falando errado, vivendo nas casas precárias das favelas, no subemprego, no alcoolismo e na prostituição.
O "funk" defende a reforma trabalhista: muitos de seus "artistas" já estabelecem relações de trabalho semelhantes às propostas por Michel Temer.
A axé-music baiana revelou irregularidades assim. Havia até pejotização. E o "funk" sinaliza que quer ser a axé-music do Rio de Janeiro, com os mesmos procedimentos de profissão e mercado.
E a religião "espiritualista", aquela que fala do "outro lado da vida", anda sendo muito conservadora ultimamente.
Muitos denunciam que essa religião vende a falsa imagem de progressista, mas apenas é uma nova embalagem da religião jesuíta que dominou o Brasil no período colonial.
Sempre que é denunciada, essa religião vai logo exibindo imagens de pobres para forçar a comoção pública.
Ela é blindada - sobretudo pela Rede Globo de Televisão, que tem filmes e novelas de seu filão - porque está associada a "atos de caridade".
Mas não. Essa "caridade", que especialistas definem como Assistencialismo, é feita milimetricamente para deixar o povo em situação subordinada, sem ameaçar os privilégios dos mais ricos.
Lembra Fernando Henrique Cardoso na sua Teoria da Dependência, que queria um "desenvolvimento" subordinado e limitado.
Diante desses dois entes, o "funk" e a religião "espiritualista", o "pobre de direita" é um subproduto de ambos em potencial.
Um pobre que, no caso do "funk", bota a culpa na "realidade" pelos hábitos machistas que contraiu, mas sem interesse próprio em superar tudo isso.
Numa cultura de verdade, ao que se saiba, o autêntico artista sempre reage à realidade, denunciando-a e intervindo, sem essa resignação chantagista dos funqueiros.
Já na religião, o pobre torna-se moralista, ainda que de forma diferente das seitas pentecostais.
Ele se resigna com a inferioridade social, se subordina à religião, se torna conservador porque lhe falam que só o "além" lhe trará uma vida "bem melhor", forçando-o a se contentar com a vida medíocre em que vive.
Há também relações de dependência, de submissão e resignação que ambas as instituições impõem aos pobres, influindo no direitismo destes.
Elas acabam produzindo pobres conservadores, que acabam reagindo contra o progresso social.
Daí para pobres não quererem se intelectualizar, permanecendo no rebolado ou na prece, é um pulo.
Num contexto em que o povo em geral está apático diante do "pacote de maldades" de Michel Temer, o "pobre de direita" virá à tona para ser estudado e questionado.
Assim como certos agentes sociais que, antes blindados e vistos como "progressistas", contribuíram para o crescimento desta figura que se comporta de maneira servil às desigualdades sociais.
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