Processo estranho.
A votação da Câmara dos Deputados já começou, ontem, com a inversão de um enunciado.
Previu-se que a questão seria perguntar aos deputados se aceitam o prosseguimento da investigação da denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer.
A mudança se deu ontem, quando a questão passou a ser perguntar aos parlamentares se rejeitam o prosseguimento da investigação.
Deve ser para desnortear a opinião pública.
Desse modo, o "sim", que antes seria para desfavorecer Temer, passou a ser para favorecê-lo.
Talvez seja um jogo psicológico, para "positivar" a situação do temeroso presidente.
Assim, o "não" estaria associado aos oposicionistas, o que daria uma conotação negativa, um sentido de "contra".
A votação, então, começou no início da noite, e durou poucas horas, apesar da maioria dos parlamentares fazerem discurso.
Um deles, o deputado Júnior Marreca, do PEN do Maranhão, disse, com um certo cinismo: "Nós não podemos ser irresponsáveis e ficar brincando de trocar presidente da República".
Claro, o presidente da República não é do PT. Se a "fila" de sucessão da presidência da República (vice-presidente, presidente da Câmara, presidente do Senado) fosse do PT, Marreca e similares iriam "brincar de trocar presidente", derrubando um a um.
Irresponsabilidade foi o resultado da votação: dos 492 deputados (descontam-se os 19 ausentes) e tirando duas abstenções, 263 deles votaram a favor de Temer. 227 votaram contra.
Pelo regulamento da casa, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, não votou.
O presidente Michel Temer ficou feliz com o resultado, até porque ele mesmo comprou os parlamentares para votar a favor dele.
E deu para falar bobagens: Temer disse que o resultado é "uma vitória da democracia" e que essa vitória "não é pessoal".
Animado, ele tem mais forças para levar adiante seu projeto de desmonte do Estado e dos direitos trabalhistas.
Mesmo tendo 95% de rejeição dos brasileiros, segundo os institutos de pesquisa.
Ainda assim, faltam as passeatas, os panelaços, as ocupações.
Ocupação é carioca ir para a praia, paulista ir para a praça, a "galera toda" (só para citar um jargão de Fausto Silva, "galera") indo "pra balada" (só para citar um jargão de Luciano Huck).
Muita gente feliz da vida diante da desnacionalização da economia, da entrega de nossas riquezas naturais para estrangeiros, para o loteamento de nosso solo para gringos, da perda dos direitos trabalhistas, da aposentadoria adiada até nunca mais.
Temer nem liga para sua impopularidade. Ele só quer mesmo o poder, para ter o foro privilegiado necessário para se livrar de investigações sobre corrupção.
Cínico, o Temer que cortava gastos públicos e verbas sociais despejou generosas quantias para os deputados votarem a seu favor.
A denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi rejeitada.
Como consolo, Janot tenta incluir Temer e dois homens de confiança deste, Eliseu Padilha e Wellington Moreira Franco, numa nova denúncia.
Ela se refere a um inquérito já instaurado contra políticos do PMDB.
Janot, que em breve esvaziará suas gavetas ao encerrar, no próximo mês, o mandato na Procuradoria-Geral da República.
Será sucedido por Raquel Dodge, indicada pelo temeroso presidente.
A guerra entre Janot e Temer tende a ser encerrada, com o temeroso obtendo vitórias.
A vitória na Câmara, ontem, completa a do Tribunal Superior Eleitoral, com o amigo Gilmar Mendes fazendo lobby para inocentar a chapa Dilma-Temer da campanha eleitoral de 2014.
No caso, a absolvição da chapa em nada influiu a favor de Dilma Rousseff, afastada do poder e hostilizada por seus raivosos e endinheirados opositores.
A absolvição favoreceu Temer, que agora tem novamente o trator liberado para esmagar os direitos dos trabalhadores.
Mas, enquanto não põem cercas na Praia de Copacabana para cobrança de ingresso dos banhistas, as pessoas ficam felizes a caçar borboletas.
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