Este é um Brasil muito, muito estranho.
Um Brasil em que valentões da Internet fazem cyberbullying para impor a "sua verdade".
Um país onde políticos conservadores envolvidos em comprovada corrupção nem sequer precisam cogitar sobre a vida atrás das grades, porque a prisão lhes é uma possibilidade nula.
Um Brasil cujas obras psicografake de certa religião espiritualista são consideradas "autênticas" porque contém frases piegas como "sejamos irmãos" e "busquemos a paz".
Um Brasil cuja parcela de machistas que fuma demais, usa drogas ou remédios e, só porque mataram suas próprias mulheres e saíram impunes, não podem sequer morrer das doenças que produzem, como câncer ou infarto.
Um Brasil em que se acredita tolamente que um sistema de ônibus vai melhorar com ônibus de pintura igualzinha exibindo logotipos de prefeitura, secretarias de Estado, consórcios etc.
Um Brasil em que a emancipação feminina é condicionada pelo machismo, de forma que as mulheres que seguem valores machistas de sensualidade são dispensadas de ter um marido, enquanto as que fogem desses valores são "aconselhadas" a arrumar um marido de bom status social.
Um Brasil em que o mercado literário, em vez de estimular o Conhecimento, o desencoraja através de obras "analgésicas".
Um Brasil em que a suposta "cultura de vanguarda", tida como "genuinamente brasileira", é um ritmo originário da Flórida reacionária, o "funk", que durante anos foi empurrado goela abaixo para as esquerdas, como chá de losna na boca de criança.
Um Brasil em que muitos ignoram seus próprios problemas, esperando que a mídia venal lhes indique quais deveriam ser as suas preocupações.
Um Brasil velho, mofado, perdido num pragmatismo viciado, em zonas de conforto e indiferenças mil.
Um Brasil que joga fora seus tesouros, mas não quer largar seus entulhos.
E é esse Brasil que veio à tona, como se abrisse uma Caixa de Pandora, nos últimos cinco anos, pelo menos.
O que chama a atenção é que, a um mês da Copa do Mundo da Rússia, os uniformes da Seleção Brasileira de Futebol não conseguem um bom índice nas vendas.
O fracasso das vendas tem um motivo explícito: a imagem pejorativa que tais camisetas tiveram com as passeatas dos "coxinhas" em 2016.
Nem precisamos comentar muito: as passeatas do "Fora Dilma" foram um espetáculo de sadismo, idiotice e até mesmo de farsa previamente ensaiada.
A coreografia dos "manifestoches", por exemplo, mais parece uma dança que levou umas duas semanas para ser feita. Tal como na Dança dos Famosos, só que com várias pessoas.
As pessoas pedindo intervenção militar, símbolos fascistas exibidos nessas supostas manifestações "pela democracia" e até uma visão exagerada de que o "13 de Março" foi o ápice desses protestos.
Falou-se que o dia 13 de Março de 2016 era um "marco da redemocratização do país", comparável ao do movimento Diretas Já.
A religião "espírita" que aqui temos deu seu tempero místico-sensacionalista: creditou as passeatas dos "coxinhas" a um suposto "despertar da humanidade", falando até no começo do que acreditam ser a "regeneração planetária".
Agora o que vemos é que os reacionários estão sentindo a chamada "Vitória de Pirro", metáfora que se baseia no famoso caso do rei de Épiro, Pirro, que enfrentou os romanos na guerra ocorrida entre 280 e 275 a.C..
Pirro saiu vitorioso, mas seu exército teve baixas imensas e prejuízos avassaladores. Consta-se que Pirro teria dito algo assim: "Se tivermos mais uma vitória dessas, estaremos arruinados".
O que vemos é que, desde os cyberbullies (valentões digitais) que agiam, pelo menos, desde os tempos da comunidade "Eu Odeio Acordar Cedo" do Orkut, até os "bolsominions" e grupos como o Movimento Brasil Livre (Movimento Me Livre do Brasil), a "Vitória de Pirro" se deu.
Defenderam da midiática gíria "balada" (integrante da "novilíngua" à brasileira) à intervenção militar, passando pela pintura padronizada nos ônibus e na extinção de encargos trabalhistas, impondo sua causa ofendendo, agredindo e ameaçando quem lhes discordasse.
Os reacionários pareciam triunfantes com suas ameaças digitais e até presenciais, mas acabaram só atraindo encrencas para si. Ainda não conseguem aceitar suas derrotas, mas não conseguem mais controlar seus prejuízos como antes.
Se a gíria "balada", que seria a "gíria do Terceiro Reich", empobrecendo a nossa língua e expressando a influência do poder midiático (no caso Rede Globo e Jovem Pan) e rompendo com o caráter efêmero e grupal das gírias autênticas, acabou sendo "gíria de fofoqueiro", é sinal dos tempos.
O autoritarismo de uma parcela de jovens ricos ou de classe média, que impuseram seus pontos de vista à custa da humilhação do outro, forçando outras pessoas a aderir a campanhas de valentonismo digital, tem seu efeito bumerangue.
Os "caçadores" de questionadores agora estão sendo humilhados, desmoralizados e desgastados. Valentões que queriam se ascender através do assassinato da reputação alheia agora sofrem a vergonha amarga que, por enquanto, tentam empurrar com a barriga.
Volta e meia um valentão desses cria um evento, aparentemente feliz, e chama as pessoas para aderir a ele, num último esforço do brutamontes ser o mestre de cerimônias durante umas poucas horas.
A simbologia do fracasso das camisetas da CBF é o fracasso de toda essa simbologia reacionária de pessoas que antes enchiam o peito para expressar suas raivas, transformando as redes sociais em seus sacos de vômito.
Hoje essas pessoas começam a lavar roupa suja em esgoto, a brigar com aqueles que não gostariam de brigar, a levar broncas de pessoas corretas que diziam idolatrar e, por outro lado, a serem traídas pelos próprios aliados de prática valentonista.
Isso não significa que haverá luz no fim do túnel. Por enquanto, são os arautos das trevas que estão sentindo as primeiras dores de uma grande queda no escuro.
O Brasil ainda está num rumo incerto e sombrio, porque a situação é complexa em todos os sentidos.
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