Recentemente, boa parte da sociedade reacionária parece querer transformar a urna eleitoral em saco de vômito, desejando eleger o truculento Jair Bolsonaro presidente do Brasil.
Boa parte desse golpismo tem como principal reduto as regiões Sul e Sudeste, que do antigo desenvolvimento social se revelou, na verdade, terreno do reacionarismo mais obscurantista.
A impressão que se tem é que, chegando o século XXI, os sulistas e sudestinos preferiram ir para o século XII.
E a "vedete" desse triste espetáculo é o Estado do Rio de Janeiro, que, de reduto de modernidade que se tornou entre 1958 e 1989, sucumbiu ao surto provincianista a partir dos anos 1990.
De repente, o Rio de Janeiro se transformou na "Calibama".
Calibama é um cruzamento de Califórnia com Alabama.
Da Califórnia, o RJ tem a mística litorânea e o glamour de abrigar muitas e muitas celebridades.
Do Alabama, o RJ tem o ultraconservadorismo de sua população.
Que o conservadorismo já era notório pelo fato do Rio de Janeiro ser intolerante ou incomodado com quem é diferente, isso é óbvio.
Nas classes escolares, as turmas não toleram pessoas esquisitas, fracassadas ou simplesmente, diferentes do comportamento bovino de cariocas e fluminenses.
Se, por exemplo, em Salvador, os amigos perguntam a alguém se ele quer ser tatuado ou tomar cerveja, no Rio de Janeiro já o empurram para tais opções, sem verificar se o outro gosta ou não.
A maioria dos praticantes de valentonismo (bullying) vive no Rio de Janeiro e é tão tirânica, no seu jeito "divertido" de ser, que mesmo pessoas que não praticam esses rituais de humilhação acabam participando dessas "cerimônias" infelizes.
É claro que o valentão, que hoje também pratica valentonismo digital (cyberbullying), também tem seus momentos de "cíberburro" ou de "covarlentão".
É quando ele acha que pode tudo, cria páginas na Internet com ofensas gratuitas, vai para as cidades dos desafetos para ameaçar e se expõe demais nas suas valentias.
Aí ele, de caçador, vira caça, se tornando vítima de seus próprios impulsos, tal qual o caçador que se atreve a pôr sua cabeça dentro da boca de um leão faminto.
O Rio de Janeiro sofre uma grave crise não por causa de problemas de segurança, finanças públicas ou corrupção.
Até esses problemas são fruto de um problema ainda maior: o reacionarismo impulsivo e o pragmatismo viciado dos fluminenses, sobretudo os cariocas.
O pragmatismo carioca é aquela mania de se contentar com pouco ou aceitar retrocessos sob a ilusão de obter algo melhor, usando como desculpa a falácia de que "não é aquela maravilha, mas até que está bom demais".
Junta-se o pragmatismo viciado dos cariocas e demais fluminenses com o reacionarismo impulsivo e temos uma situação surreal: a "patrulha" em defesa dos retrocessos.
Foi assim com a queda do radialismo rock, quando se trocou o estilo criativo da Fluminense FM pelo radialismo pop repetitivo, previsível e idiotizado da Rádio Cidade.
Foi assim com a gíria "balada", que integra a "novilíngua" (ver 1984 de George Orwell) à brasileira a empobrecer o vocabulário juvenil suprimindo palavras que vão de "festa" a "jantar entre amigos".
Foi assim também com as mulheres-frutas, a pintura padronizada nos ônibus, o fanatismo futebolístico e deve ser também com o bolsonarismo.
Só que as chacotas dos valentões patrulheiros em defesa do "estabelecido" no Rio de Janeiro determinam um preço muito caro a ser pago.
Não bastasse os valentões se expuserem demais a ponto de, em dado momento, não puderem controlar as encrencas que acumulam contra si, eles também são traídos pelos seus próprios aliados e brigam com seus amigos por causa de privilégios.
Mas não é só isso. As causas retrógradas que eles defendem com unhas e dentes se revelam prejudiciais, nocivas, nefastas, desastrosas, e os reacionários que defendiam com convicção raivosa tamanhas barbaridades têm que recuar, envergonhados.
A causa retrógrada da moda é o bolsonarismo ou, se não for o caso, a defesa, de uma forma ou de outra, do golpe militar, eufemismos à parte.
O sujeito que discordar disso "ganha" um "pacote" de medidas de humilhação.
Nas redes sociais o perfil do discordante é invadido por mensagens combinadas de umas dezenas de integrantes, sob ordens do valentão da ocasião.
No começo, são comentários cheios de ironias e pilhérias, mas depois surgem ameaças das mais cruéis.
Aí, o valentão monta um fotolog se apropriando do acervo particular da vítima para fins de calúnia e difamação.
Tudo isso tem um preço muito caro. O valentão costuma se achar invulnerável, acreditando na impunidade e na sua suposta capacidade de dar a volta por cima até nas piores encrencas.
Chega um momento em que o valentão não consegue mais empurrar com a barriga as encrencas que atrai nas suas campanhas de humilhar, ofender e até eliminar o outro.
Aí o valentão se transforma no "covarlentão" (covarde + valentão), como descrevi no meu conto "Cíberburro", no meu livro O Balão e Outras Estórias.
No conjunto da obra, o Rio de Janeiro, como um todo, também paga um preço alto pelas chacotas que faz a quem não segue o "estabelecido", de uma forma ou de outra.
O Estado não é mais referência alguma para o resto do país, e, por ironia, recebe chacotas do resto do Brasil pelo fato do Rio de Janeiro combinar intolerância, imprudência, bairrismo e um cego e burro complexo de superioridade.
Além do recente apreço pelos retrocessos, coisa de uns 25 anos. Por causa daquela falácia irritante: "não é aquela maravilha, mas até que está bom demais".
Com a recente ânsia de ver o Brasil realizando um novo golpe militar, os fluminenses vão mais uma vez causar prejuízo com suas defesas intransigentes e seu patrulhamento imprudente.
Diante da diarreia eleitoral que pretende realizar votando em Jair Bolsonaro e em qualquer um de sua família que eleger a um cargo político, os fluminenses se esquecem do que fizeram com Sérgio Cabral Filho e Eduardo Cunha.
Hoje Cabral e Cunha são hostilizados de tal forma que viraram "cachorros-mortos", mas houve um tempo em que os dois eram "deuses" e protegidos até pelo valentonismo digital contra opositores.
Da mesma forma que outras "causas nobres" defendidas pelos valentões virtuais, que caíram em desgraça.
A Rádio Cidade "roqueira" virou um humilhante espectro em web radio, a gíria "balada" virou jargão de fofoqueiros e a pintura padronizada nos ônibus virou uma embolorada lona do circo em chamas da pretensa "mobilidade urbana" que só agravou a corrupção político-empresarial no setor.
Em todos os casos com valentões tentando sair, pelo menos com arranhões, das encrencas em que se meteram depois de comandar tantas e tão graves humilhações.
Com o bolsonarismo e a "Golpemania" que atinge o Rio de Janeiro, os costumeiros problemas que os fluminenses enfrentam, como a criminalidade e o descaso político, só agravarão.
Não será com mais truculência e autoritarismo que os problemas se resolvem. Pelo contrário, a experiência mostra que eles se agravam e se voltam contra quem acreditaria ser beneficiado pelas medidas de exceção.
Os valentões se esquecem que o feitiço pode virar contra o feiticeiro. E, quando o caçador enfia sua cabeça na boca de um leão, a mordida é praticamente certa.
E não adianta o valentão dar risadas, porque eles lhe poderão ser trágicas. Como será a tragédia de um Rio de Janeiro que quer uma diarreia política para o si e para o Brasil.
Será mais uma vez a ruína a ser provocada pela catarse cega do calor do momento.
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