Hoje, dia da Abolição, há muito o que se refletir, questionando o mérito do fato histórico da assinatura da Lei Áurea, dentro de uma complexidade sociológica que muito se divulga há anos.
O que se quer chamar a atenção, aqui, é sobre uma religião tida como a "melhor" do país e que mais parece uma "Allison Mack do espiritualismo".
Essa "religião do amor", o Espiritismo desfigurado, moldado aos caprichos medievais de seus usurpadores brasileiros e abençoado pelo poder midiático - primeiro os Diários Associados, depois e atualmente as Organizações Globo - começou se dizendo "abolicionista".
A definição é duvidosa e superestimava tanto a carona tardia de um médico cearense na causa abolicionista, um dos fundadores dessa religião, quanto ao suposto missionarismo atribuídos ao imperador Pedro II e sua filha Isabel.
O "Espiritismo da Globo", que produz falsos filantropos promovendo os midiáticos "médiuns" por uma suposta caridade digna de quadro do Caldeirão do Huck, inventou que Pedro e Isabel eram engajados na luta pelo fim da escravidão.
Não eram. Pedro II adotou posturas muito hesitantes, conforme afirmam os registros históricos. Isabel era a funcionária de plantão e apenas assinou sobre decisão de terceiros, parlamentares que há muito atuavam pelo fim da escravidão.
Todavia, tínhamos um Legislativo conservador, pois mesmo os liberais eram na prática conservadores, vide a famosa anedota sobre os "luzias" (liberais) e "saquaremas" (conservadores), "nada mais parecido com um saquarema do que um luzia no poder".
E aí não houve a assistência social esperada para os escravos libertos.
Pode ter sido uma conversa para boi dormir, mas o Espiritismo catolicizado que se plantou desde as sementes da FEB difundiu essa estória de maneira verossímil.
Hoje nem isso existe mais, pois o ultraconservadorismo que contaminou o Espiritismo se agravou com a ascensão de um "médium" de Minas Gerais muitíssimo famoso.
Usurpador dos mortos e criador de mensagens fake que dizia ser do além, ele espalhou e botou na conta de um monte de gente uma série de conceitos moralistas dos mais retrógrados.
Ele tornou-se conhecido, por seus críticos, como um "AI-5 do bem": usava uma retórica "paternal" para dizer que as pessoas deveriam sofrer caladas, mesmo as piores desgraças.
Tido erroneamente como "progressista", graças ao falso cheiro de pobre que o "médium" carregava em si mesmo e no ostensivo espetáculo da pretensa caridade - caravanas que só serviam para promoção pessoal e pouco faziam para o povo pobre - , ele sempre foi retrógrado e até reacionário.
Ele defendeu abertamente a ditadura militar num programa de TV de grande audiência. De tal maneira que não dava para entender por que setores das esquerdas ainda admiraram o suposto "médium" que encerrou seus dias no Triângulo Mineiro.
Isso é chocante, porque muitos têm na mente a imagem adocicada do tal "médium" mineiro, construída como uma dramaturgia de novela, como um pretenso modelo de "caridade" e "bondade" que nunca trouxe resultados expressivos para os mais necessitados.
Falam que ele "enxugava lágrimas", mas a verdade é que ele nunca preveniu o pranto alheio e, como oportunista, queria fazer promoção pessoal e sensacionalismo barato com a tragédia alheia.
Graças a esse "médium", de visual cafona e uma esperteza que o fazia sintetizar, por antecipação, a imunidade de Aécio Neves e o assistencialismo de Luciano Huck (ambos o cumprimentaram no fim da vida), o Espiritismo catolicizado passou a ser abertamente ultraconservador.
Mais do que as religiões evangélicas "pentecostais", o Espiritismo catolicizado e abençoado pela Rede Globo é a que mais apoia a Operação Lava Jato, a Escola Sem Partido, o Movimento Brasil Livre (aka Movimento Me Livre do Brasil) e as reformas trabalhista e previdenciária.
Aqui se mostra que o Espiritismo feito no Brasil não mede escrúpulos no seu reacionarismo cada vez mais explícito, de fazer Silas Malafaia e Marco Feliciano ficarem de queixo caído.
A postura supostamente abolicionista deu lugar a uma posição abertamente escravista, com base numa corrente católica que os ditos espíritas no Brasil pegaram emprestado do entulho medieval descartado pelos católicos, a Teologia do Sofrimento.
Com base nisso e tendo o "médium" mineiro como maior pregador, o Espiritismo brasileiro prega a aceitação do sofrimento, por pior que seja, mesmo que se perca uma encarnação inteira com uma coleção de desgraças em doses traumatizantes.
No âmbito profissional, a "moral espírita" que aqui temos prega que "temos que dedicar nossa vida apenas ao servir".
Confundem "serviço" com "servidão" e chegam a dizer às pessoas para "amarem o sofrimento" e "agradecerem a Deus pela desgraça obtida".
Usam todo tipo de desculpa para os retrocessos trabalhistas e a opressão que o patronato impõe para o trabalhador.
Se a carga horária é excessiva, pedem para o trabalhador ter paciência e fé e cumprir a jornada até o esgotamento de suas forças.
Se o salário é muito baixo, o trabalhador que tenha a abnegação necessária e deixe de gastar até mesmo parte do que lhe é mais essencial. Se der para viver a base de pão e água e morar na rua, "tudo bem".
Se os patrões ou mesmo colegas de trabalho lhe oprimem, armam intrigas e outros incidentes infelizes, lhe pedem para ficar tranquilo, viver na prece e sorrir para seus algozes.
Se o sujeito não consegue arrumar emprego, arrume um trabalho "qualquer nota", mesmo que seja para arrecadar uns centavos.
Isso é praticamente uma visão escravagista. Se o Espiritismo brasileiro de hoje existisse na época da escravidão, eles pregariam que "chicote no lombo dos escravos é refresco".
O Espiritismo brasileiro inventa todo tipo de desculpa para a pior desgraça. E ainda fala coisas como "que importam décadas de desgraças diante de uma eternidade de bênçãos".
Mas seus pregadores nunca sofrem desgraças, pegam parte do dinheiro da caridade e juntam com o dinheiro lavado das grandes empresas e vão fazer turnê pelo Primeiro Mundo, dando palestras para ricos e voltando ao país com medalhas e diplomas que só ajudam suas vaidades pessoais.
Desviam parte dos donativos para revender em brechós e armazéns. Pegam o lucro dos livros vendidos para comprar carros do ano ou apartamentos cujo conforto é bem maior do que muitos pensam ser o triplex do Guarujá erroneamente atribuído ao ex-presidente Lula.
Aliás, nossos "tão progressistas espíritas", sem escrúpulos, falam tão mal da corrupção, dentro do mesmo ponto de vista hipócrita em que a plutocracia reclama da suposta corrupção dos outros, mas nunca a de si mesma.
Ainda vão revelar muitas coisas desse "Espiritismo à brasileira" que mais parece uma prima pobre da Cientologia. Pobre, em termos, porque é uma religião que se prova estar mais e mais ao lado das elites do atraso que escravizam o povo brasileiro, literal ou simbolicamente.
Comentários
Postar um comentário