JANJA (D), AO LADO DE DILMA ROUSSEFF - Esquerda mainstream com sabor de pieguice.
Diferente das esquerdas de 1961-1964 que foram impulsionadas pelo governo Kubitschek e que, mesmo dotada de eventuais ingenuidades, estava com os pés no chão, as esquerdas lulistas de hoje, bem mais do que entre 2003 e 2016, vivem flutuando nas nuvens.
O nível de pieguice já teve ensaio quando as esquerdas aceitaram os "brinquedos culturais" que a direita moderada extraiu do culturalismo da ditadura militar - mais precisamente a Era Geisel - ofereceu e tentou ressignificar para os tempos democráticos de então. Eram valores supostamente positivos que, em tese, faziam o povo pobre sorrir e que, mesmo próprios do imaginário paternalista da direita, tentaram uma associação forçada com o esquerdismo.
"Médiuns espíritas" que simbolizavam tradições de religiosidade marcadas por uma suposta filantropia e um pretenso pacifismo, ídolos cafonas que simbolizavam a pretensa consolação das frustrações do povo pobre e mulheres-objetos que simbolizavam a "alegria" e a "vivacidade" da "mulher brasileira" eram empurrados para o imaginário esquerdista através de um discurso persuasivo associado a uma cosmética simbólica desprovida de raiva e aparente intolerância social.
Isso fez uma diferença muito negativa nas esquerdas médias de hoje em relação às dos tempos de Jango. E fez com que as esquerdas hoje se tornassem subservientes, aceitando como aliado qualquer direitista que lhe apertasse a mão, falasse palavras "mágicas" como "interatividade", "caridade", "paz", "mobilidade urbana", "resiliência" e, ultimamente, "democracia" e prometesse fazer o pobre sorrir.
E aí vemos o quanto essas esquerdas, na verdade pessoas de classe média abastada e antigos esquerdistas de raiz que foram emancipados, se tornaram obedientes e com uma certa ojeriza ao senso crítico, enquanto sonham em extrair o que há de "positivo" no mundo da direita para enxertar, como prótese, no imaginário esquerdista.
Esse sentimentalismo mostra o quanto está ruim, hoje, as esquerdas tomarem o poder, marcadas hoje por um ranço piegas antes inimaginável. Não é preciso pensar muito para ver que, na "festa democrática" do lulismo, estão também os excluídos dessa "doutrina da inclusão".
Os excluídos são os miseráveis da vida real, que sentem que viver em favelas ou em ruas não é a "vida cor de rosa" da dita "campanha contra o preconceito" da intelectualidade bacana. Outros barrados no baile lulista também são o proletariado raiz, que não aderiu ao peleguismo, o campesinato, os solteiros convictos que não aceitam fazer papel de imbecis nas redes sociais, e os intelectuais genuínos e cientistas, marcados pelo pensamento crítico, pelo estudo investigativo e pelas pesquisas aprofundadas diversas.
Esse "outro Brasil", que é excluído da festa brega-identitária do lulismo de hoje, era mais valorizado nos tempos de João Goulart. Mesmo a relativa lembrança do filme Eu Ainda Estou Aqui, de Walter Salles - curiosamente, o filho do banqueiro Walther Moreira Salles, então ministro da fase parlamentarista de Jango, no tempo em que o próprio cineasta era criança - , é apenas uma sombra das preocupações sociopolíticas de antes, mais aprofundadas.
Hoje se observa um clima de pieguice nas esquerdas médias, uma sede infantil de protagonismo e uma certeza ilusória de que vencerão tudo, porque são "o bem". Porque, levando às últimas consequências a crença na "burguesia nacional", ilusão cultivada pelos esquerdistas de 1964, os lulistas perdem a essência combativa e fingem que seu protagonismo era espontâneo quando, na verdade, ele foi negociado com a direita moderada, a "parte boa" do golpismo politico-jurídico de 2016.
E aí fico preocupado porque as esquerdas médias de hoje acham que podem tudo. Acham que o mundo é todo bonzinho com elas, e se iludem com o maniqueísmo fácil de Lula contra Jair Bolsonaro. A meu ver, todo esse futuro do lulismo soa como uma miragem, mas a empolgação emocional desse protagonismo artificialmente conquistado cega os lulistas que já se consideram os vencedores de 2026.
Por muito menos, as esquerdas perderam feio o protagonismo em 1964.
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