Orlando, cidade do Estado da Flórida, costuma ser a cidade dos sonhos dos turistas latinos que querem viajar aos EUA.
Virou cenário de pesadelo por duas vezes.
No último dia 10, um fã alucinado e armado de revólver matou a cantora Christina Grimmie, de 22 anos, quando ela iria dar autógrafos para os fãs, após o fim de uma apresentação.
Na madrugada do dia 12, foi a vez de outro atirador abrir fogo contra 50 pessoas na boate Pulse, frequentada pela sociedade LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros).
Os dois atiradores, depois identificados, estão mortos: o de Christina, Kevin James Loibi, de 27 anos, se suicidou. Omar Siddiqui Mateen, autor da chacina, de 29 anos, foi morto por policiais.
Ambas as tragédias revelam muitos problemas ligados a retrocessos morais.
Kevin parecia um daqueles fanáticos que matam seus ídolos por pouca coisa, provavelmente confundindo fantasia com realidade.
Omar, como fundamentalista islâmico, parecia um saudosista cego de uma sociedade com os padrões sociais, culturais e morais de três mil anos atrás.
Ambos reflexos da hiper-realidade que contamina as mídias sociais.
Em que as convicções sociais, longe de serem meras opiniões, se tornam projetos de tirania.
Que, em hipóteses menos sangrentas, porém cruéis, resultam em trolagens e cyberbullyings que são assassinatos de reputações de quem não pensa de acordo com o establishment.
Afinal, os troleiros e valentões digitais são, na verdade, midiotas babadores de gravatas que aceitam tudo que autoridades, celebridades, executivos de mídia, tecnocratas, empresários e acadêmicos decidem, mesmo em detrimento do interesse público.
Até rádios de rock ruins e ônibus com pintura padronizada eram defendidos com mão-de-ferro por esses tresloucados fascistas mirins.
Fora políticos retrógrados ligados ao PMDB e PSDB, endeusados por internautas idiotizados, porém moralistas. Moralistas sem moral, diga-se de passagem.
Na melhor das hipóteses, o que vemos são gafes como de Guilherme Fiúza dizendo que o New York Times é financiado pelo PT.
Daqui a pouco Fiúza dirá que o PT, surgido em 1980, é o culpado pela crise da Bolsa de Valores de Nova York em 1929.
Na pior das hipóteses, vemos pessoas planejando crimes porque veem suas fantasias, seus interesses e suas convicções pessoais serem contrariados pela realidade dos fatos.
Daí que Omar, por exemplo, reagiu com fúria quando viu dois homens se beijando na boca.
Talvez Kevin ficasse furioso ao saber que Christina Grimmie lhe era inacessível. Como o alucinado Rodrigo Augusto de Paula, que tentou matar Ana Hickmann e sua equipe e foi morto em legítima defesa pelo cunhado.
As mídias sociais foram mais uma utopia lançada pelos intelectuais "bacanas" que foi derrubada.
Eles acreditavam numa "revolução social" pela Internet e apenas deram uma pespectiva unilateral da coisa.
Esqueceram que, se por um lado a Internet, através de blogues progressistas, está derrubando o império do baronato midiático, as mídias sociais fazem o caminho oposto.
Elas viram redutos dos mais diversos obscurantismos: morais, culturais, religiosos, sexuais, tecnocráticos. Até a mobilidade urbana vira refém de paradigmas vindos da ditadura militar.
Daí os atos racistas que viraram "moda" no ano passado.
Daí os atos machistas, alguns sanguinários.
Daí a psicopatia de muitos midiotas que contagia até diretores teatrais como Cláudio Botelho e jornalistas como Guilherme Fiuza, tomados do reacionarismo mais estúpido e fantasioso.
Mas há também o outro lado.
O livre comércio de armas, problema que aflige a sociedade estadunidense.
E que é defendido por setores conservadores, como o Tea Party, e representado pela entidade Nationel Rifle Association (NRA), a Associação Nacional da Carabina, numa tradução ao pé-da-letra.
É esse o problema que envolve os casos Christina Grimmie e boate Pulse.
As tragédias de Orlando aconteceram porque cidadãos moralmente despreparados tiveram livre acesso à compra de uma arma de fogo.
É até lamentável que, nos tempos da pseudo-esquerda brasileira, entre 2005 e 2007, o comércio de armas tenha sido uma falsa bandeira de "esquerdistas de fachada" nas mídias sociais.
Eles esqueceram que boa parte da violência reduziria com o estatuto do desarmamento, que aliás foi votado no Brasil e aprovado, para desespero dos armamentistas.
Hoje essa gente que fingia elogiar Lula, Dilma, PT, PSOL, Che Guevara, Emir Sader e Carta Capital está louca para ver Jair Bolsonaro ocupando o Palácio do Planalto.
A homofobia do atentado à boate Pulse, aliado ao obscurantismo religioso do atirador, também é outro problema que, associado ao armamentismo, cria um verdadeiro combo de retrocessos sociais.
Um pacote moralista severo que tenta reprimir avanços e mudanças sociais.
O Brasil tem um risco de haver uma nova Orlando.
Sobretudo um Rio de Janeiro que retrocede em queda livre.
Já existem rumores de planos de atentados durante as Olimpíadas de 2016.
Do jeito que se deixam ocorrer tiroteios, sobretudo nos Complexos do Alemão e Maré, no caminho entre o Galeão e o Centro, pode ocorrer um massacre no Rio de Janeiro.
Mas como os cariocas estão tão indiferentes e até esnobes aos problemas - de vez em quando surge um sujeito que diz "No Rio não tem mais jeito" como se fizesse dos problemas uma piada - , tudo de pior pode acontecer.
Os cariocas já devem explicar à nação por que quiseram eleger o nada carismático Eduardo Cunha para ser deputado federal. O cara quase destruiu o Brasil.
E as bancadas BBB, da Bala (versão tosca do NRA, sem uma instituição representativa oficial), da Bíblia e do Boi, famosas por posições que variam entre a homofobia e a pistolagem?
Elas também foram eleitas em massa, tanto no Sul e Sudeste como nas demais regiões coronelistas, sobretudo no interior, sob a desculpa de defender a moralidade e a "família" (dentro dos padrões patriarcalistas).
O medo é que se criam condições para uma Orlando brasileira.
E o Rio de Janeiro parece ser favorito nessa candidatura à tragédia de dimensões olímpicas.
Vivemos um Brasil desgovernado e vulnerável, comandado por um presidente interino já considerado pelo TRE paulista "ficha suja" e impedido de competir a novos cargos eletivos.
O Brasil vive uma situação vulnerável e insegura.
Orlando já é uma cidade preferida de muitos brasileiros com dinheiro no bolso.
Mas Orlando pode ser aqui. Esse é o risco.
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