Membro do Movimento Brasil Livre (que deveria mudar seu nome para Movimento Me Livre do Brasil) e, "apartidário", foi vereador eleito pelo DEM paulista, Fernando Holiday veio com uma "pérola".
Ele quer revogar o sistema de cotas para negros nas universidades e extinguir o feriado do Dia da Consciência Negra, a ser celebrado no próximo dia 20.
Negro, mas de orientação direitista, Holiday argumenta que as duas iniciativas promovem o "vitimismo" do povo negro e que as ideias que o membro do MBL defende visam "combater o racismo" e "valorizar o povo brasileiro independente de raça e cor".
"Propor o fim das cotas raciais em Concursos Públicos Municipais significa que São Paulo não pode beneficiar seres humanos em detrimento de suas características biológicas, significa que somos um País miscigenado onde todos devem ser tratados igualmente perante a lei. Isso sim é combater o racismo", disse ele, sobre o sistema de cotas.
Sobre o feriado, ele comentou: "Propor a revogação do dia municipal da Consciência Negra significa alertar a sociedade de que não devemos nos dividir em classificações e que devemos preeservar a consciência humana, independente de etnia ou cor da pele. Isso sim é combater o racismo".
Se depender desse raciocínio, Holiday poderia muito bem defender a revogação da Lei Áurea, entrando no clima de "revisão histórica" do sistema escravocrata, num contexto em que redes de lojas como McDonalds e Riachuelo são acusadas de explorar trabalho escravo.
Já existe até projeto de lei, de número 3.842 de 2012, que pretende "rever os conceitos" de trabalho escravo, nos quais deixariam de ser citadas as "condições degradantes de trabalho" e a "carga horária extensiva".
Daí para revogar a Lei Áurea e permitir que empresas remunerem mal os trabalhadores, forçados a trabalhar mais, perdendo garantias sociais e vivendo em condições degradantes, como alojamentos precários, por exemplo, é um pulo.
E se Fernando Holiday defendesse também o fim do feriado de Sete de Setembro? Se usar os mesmos argumentos que usa para o Dia da Consciência Negra, ele poderia muito bem dizer que o Brasil é, acima de tudo, um "país americano" e justificasse a subordinação aos EUA como um "panamericanismo".
Panamericanismo... Hum. Isso lembra Jovem Pan. Mas isso é um outro assunto.
Sobre as cotas e o Dia da Consciência Negra, Fernando Holiday está equivocado com suas alegações de "vitimismo".
É claro que o sistema de cotas nas universidades é uma medida relativamente paliativa, ela não pode ser a única implantada, mas até certo ponto ela ajuda, sim, os negros pobres a entrarem no ensino superior público para obter uma formação mais abrangente.
A medida serve como um auxílio dentro de um sistema cujos ensinos fundamental e médio são em maior parte precarizados.
Além disso, é muito bom auxiliar estudantes pobres a obter formação universitária, permitindo um aumento de qualidade de vida, benéfica para eles e suas famílias.
Quanto ao Dia da Consciência Negra, é equivocado Holiday reduzir o feriado à celebração de um vitimismo.
É certo que o povo negro passou a viver no Brasil de uma forma injusta, cruel e trágica, através da condição de escravos.
Mas em que pese esse cenário indiscutivelmente doloroso e dramático, com separação forçada de famílias de africanos por conta do comércio escravo, os negros puderam reinventar a cultura de seus países de origem para desenvolver uma bem brasileira.
Com o tempo, a luta dos negros revelou vitórias muito positivas.
Um dos maiores intelectuais que o Brasil teve em sua história, o geógrafo Milton Santos, era negro.
O Dia da Consciência Negra serve até para negros se reunirem para eventos, mostrarem suas qualidades, seus potenciais, seus projetos e suas conquistas.
É mais uma data de fortalecimento de auto-estima do que de vitimismo.
A partir desse dia, se divulga aos brasileiros em geral o legado que os negros desenvolveram e desenvolvem para o Brasil.
Para uma geração que acha que negritude se limita às apologias a valores retrógrados do "funk", através do sexismo machista e da misandria feminina, tanto faz condenar o Dia da Consciência Negra ou pedir a revogação da Lei Áurea.
A Lei Áurea pode ter tido seus equívocos, e não foram poucos, mas pelo menos pôs fim à institucionalização do trabalho escravo que, desde então, passou a ser uma prática legalmente clandestina.
A situação de hoje é de muita apreensão, com os vários setores da direita política, econômica e social retomando o poder à força, mais por inventar defeitos graves dos outros (o PT, por exemplo) do que pelas qualidades positivas que os direitistas não têm.
Eles tentam falar macio.
Fernando Holiday "combatendo o racismo" pedindo o fim do Dia da Consciência Negra.
Michel Temer dizendo que limitará os gastos públicos para "estimular a geração de renda e emprego".
A Escola Sem Partido dizendo defender um "ensino cidadão", sem "manipulação ideológica".
A EBC reformulada sem o "aparelhamento ideológico" de antigos funcionários.
Belas embalagens de um conteúdo amargo e indigesto. Palavras bonitas de significados ocultos e sombrios.
É assim que agem os neoconservadores de hoje.
O Brasil irá perder muito com essa gente.
Haverá um tempo em que as passeatas dos "revoltados" causarão muita vergonha e constrangimento. Mas os arrependidos não tardarão a vir.
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