Quem nasceu a partir de 1978, no Brasil, tinha uma grande oportunidade pela frente.
Sendo a geração que conheceu a Internet na adolescência, e os mais novos na infância, poderiam se tornar pessoas fartamente informadas de tudo.
Havia possibilidade de conhecerem de tudo: da Semana de Arte Moderna à Pop Art, do CPC da UNE ao rock da Baratos Afins, de João Gilberto aos Sparks, da banda Fellini aos Teardrop Explodes, do Gentle Giant ao Toninho Horta, de Cacilda Becker a Procópio Ferreira.
Poderia ter tido como livro de cabeceira obras como Feliz Ano Velho de Marcelo Rubens Paiva, ou tirar de letra todo o rock alternativo do período 1979-1992 produzido na Grã-Bretanha.
Ou ler Umberto Eco como quem lê um best seller. E não estamos falando em O Nome da Rosa, mas de livros como Apocalípticos e Integrados.
Ou achar manjados os sons de Jorge Ben Jor e Paulinho da Viola, embora sem dúvida de indiscutível valor.
Só que isso não aconteceu.
A mídia venal não deixou. Ela manipulou para que essa geração fosse culturalmente precarizada.
Bombardeou os primeiros "baixinhos" com a erotização consumista do Xou da Xuxa, e de imbecilidades que hoje só conseguem sobreviver nos Ploc 80 da vida, como Dr. Silvana e Absyntho.
Depois veio a máquina de fazer dinheiro de Sullivan & Massadas e sua pseudo-MPB para motéis, mais tarde seguida pelos ídolos do samba-fake e do caipira-fake da Era Collor.
A Era Collor já desmontava o radialismo rock com a fórmula ridícula das "Jovem Pan com guitarras" e baniu do conhecimento juvenil as bandas alternativas que faziam a vanguarda nos EUA e no Reino Unido.
Ou alguém acredita que o rock mainstream que rola nas 89 FM da vida é realmente alternativo?
A mídia venal desviou o caminho dos jovens e corrompeu seu apetite por novidades e preciosidades.
Os jovens ficaram presos no playground cultural da mídia venal dos anos 1980 (mais para segunda metade), 1990 e 2000.
A turma de 1978-1983, salvo exceções, passou boa parte da vida, até os 27 anos, presa na indigência cultural de um pop insosso, da bregalização do "popular demais" e do narcisismo das noitadas e do desfile de moda.
Em 2004, digeriram muito tardiamente o hip hop de 1983, mas na safra duvidosa do gangsta rap, e a música eletrônica do Verão do Amor de 1988, já na safra nem sempre criativa dos DJs mais preocupados em animar festinhas do que fazer boas mixagens.
Poucos fugiam do superficialismo que se proclamava "diferente" mas sempre se apegava à mesmice do hit-parade de qualquer estilo musical.
Ou de um conhecimento de História e outras modalidades culturais que não ia além do que a TV aberta mostrava.
Se um horrendo programa da tarde na TV aberta mostrava gente surfando, a onda era curtir surfe. Se não, nada feito.
Se, no Rio de Janeiro, o jornal O Dia dizia que a onda é ir para a exposição de Leonardo da Vinci, vai o pessoal que nem gado fazer fila para ver. Se não for assim, nem em sonhos.
A geração pós-1978 chegava aos 25 anos falando que nem adolescente e usando jargões dados de bandeja pela mídia venal, como "balada", a gíria "use Huck" da Globo e Jovem Pan, e "galera", jargão "eternizado" por Fausto Silva.
E passava a ter preconceito com a MPB, achando que a música brega-popularesca a substituiria, sob a desculpa esfarrapada do "combate ao preconceito".
Passaram muito tempo se preocupando mais em usar tatuagens do que ler livros para parecerem "diferentes". Mas era (e é) tanta gente tatuando que ser diferente agora é não ser tatuado.
E agora não precisam mais odiar ler livros, porque agora os livros estão de acordo com a indigência cultural com as listas dominadas por títulos que passam longe de qualquer missão de transmitir conhecimento.
Boa parte dos livros mais vendidos tem a qualidade intelectual inferior a de uma notinha banal dos mais populares trend topics do Twitter.
É claro que existem exceções, mas elas não puderam ser regra.
A maioria das pessoas nascidas a partir de 1978 preferiu se abastecer do junk food cultural fornecido pela mídia venal.
Muitos só puderam sair do playground do mainstream e, mesmo assim, de maneira muito tímida, depois dos 30 anos de idade.
O espírito de garimpagem morreu até entre os roqueiros ditos radicais, cada vez mais resignados com a mesmice repetitiva do hit-parade específico.
Pessoas que só compreendem o mundo a partir de 1975, que é o que a mídia pôde permitir, em referenciais culturais, para a turma que nasceu a partir de 1978.
O resto é pré-história.
É graças a esse cenário que se formaram os "revoltados", os "coxinhas" e a turma que só quer "descer até o chão" ou "sair do chão" numa "balada" com a "galera".
Gente cujo mestre maior é Luciano Huck, amigo de Aécio Neves e João Dória Jr..
Daí o playground midiático que fez uma geração que poderia ser brilhante e surpreendente sucumbir à decepção de uma péssima educação cultural trazida pela mídia patronal.
Comentários
Postar um comentário